“(...) na democracia, cada cidadão comum é de fato um rei – mas um rei numa democracia constitucional, um monarca que decide apenas formalmente, cuja função é apenas assinar as medidas propostas pelo governo executivo. É por isso que o problema dos rituais democráticos é semelhante ao grande problema da monarquia constitucional: como proteger a dignidade do rei? Como manter a aparência de que o rei toma as decisões, quando todos sabemos que isso não é verdade? Trotsky estava certo então em sua crítica básica à democracia parlamentar: não é que ela dê poder demais às massas não instruídas, mas que, paradoxalmente, apassive as massas, deixando a iniciativa para o aparelho do poder estatal (ao contrário dos ‘sovietes’, em que as classes trabalhadoras se mobilizam e exercem o poder diretamente). Por conseguinte, o que chamamos de ‘crise da democracia’ não ocorre quando os indivíduos deixam de acreditar em seu poder, mas, ao contrário, quando deixam de confiar nas elites, que supostamente sabem por eles e fornecem as diretrizes, quando vivenciam a angústia que acompanha o reconhecimento de que ‘o (verdadeiro) trono está vazio’, de que a decisão agora é realmente deles. É por isso que, nas ‘eleições livres’, há sempre um aspecto mínimo de boa educação: os que estão no poder fingem educadamente que não detêm de fato o poder e nos pedem para decidir livremente se queremos lhes dar o poder – num modo que imita a lógica do gesto feito para ser recusado.”
In Primeiro como Tragédia, depois como farsa, de Slavoj Zizek.
Assinar:
Postar comentários (Atom)
Fotos no Facebook
terça-feira, 5 de fevereiro de 2013
Democracia: tragédia e farsa.
“(...) na democracia, cada cidadão comum é de fato um rei – mas um rei numa democracia constitucional, um monarca que decide apenas formalmente, cuja função é apenas assinar as medidas propostas pelo governo executivo. É por isso que o problema dos rituais democráticos é semelhante ao grande problema da monarquia constitucional: como proteger a dignidade do rei? Como manter a aparência de que o rei toma as decisões, quando todos sabemos que isso não é verdade? Trotsky estava certo então em sua crítica básica à democracia parlamentar: não é que ela dê poder demais às massas não instruídas, mas que, paradoxalmente, apassive as massas, deixando a iniciativa para o aparelho do poder estatal (ao contrário dos ‘sovietes’, em que as classes trabalhadoras se mobilizam e exercem o poder diretamente). Por conseguinte, o que chamamos de ‘crise da democracia’ não ocorre quando os indivíduos deixam de acreditar em seu poder, mas, ao contrário, quando deixam de confiar nas elites, que supostamente sabem por eles e fornecem as diretrizes, quando vivenciam a angústia que acompanha o reconhecimento de que ‘o (verdadeiro) trono está vazio’, de que a decisão agora é realmente deles. É por isso que, nas ‘eleições livres’, há sempre um aspecto mínimo de boa educação: os que estão no poder fingem educadamente que não detêm de fato o poder e nos pedem para decidir livremente se queremos lhes dar o poder – num modo que imita a lógica do gesto feito para ser recusado.”
In Primeiro como Tragédia, depois como farsa, de Slavoj Zizek.
In Primeiro como Tragédia, depois como farsa, de Slavoj Zizek.
Assinar:
Postar comentários (Atom)
Atividade no Facebook
Mais vistas:
-
Fazem carnaval o ano inteiro com o nosso dinheiro: pior que é verdade!!!
-
Na verdade, o homem se enfraquece diante de um mundo que perdeu a fé, desmotivou a unidade, encarcerou o social, secularizou o que quis, fo...
-
Esta expressão atravessou as eras desde que saiu da boca de Deus e foi ao encontro de um homem que tinha uma missão quase impossí...
-
O Prêmio Nobel de Literatura de 2014 ficou com o francês Patrick Modiano, 69. Filho de um judeu de Alexandria e de uma comediante belga ...
-
Devido a problemas técnicos com o funcionamento deste blog, comunicamos um novo endereço para que você não deixe de ler qualquer postagem de...
-
Tratado no “Banquete” descreve-se como sendo o mito do nascimento de Eros. Quem fala sobre o nascimento de Eros não é diretamente Sócrates,...
-
Uma das belíssimas, não menos importantes que tantas outras, passagens bíblicas situada no Livro do Gênesis, revela-nos a luta do Patria...
-
(foto de meus arquivos pessoais: zoológico de Brasília, DF) Não sei se li bem a peça de Eugène Ionesco, intitulada “O rinoceronte”, d...
Nenhum comentário:
Postar um comentário