O tema foi “O encontro de Nelson Rodrigues e Arnaldo Jabor” na palestra, anteontem, no Polo de Pensamento Contemporâneo, no Jardim Botânico. Trechos da conversa de Jabor:
“Antigamente as pessoas liam com 14 anos. Aos 18, eu era do CPOR, da cavalaria, junto com o Jofre. Nelson ia buscar o filho e eu pegava carona com eles. Foi quando o conheci.”
“Quando eu falava de política, ele ficava largamente entediado. 'Jabor, para com isso'.”
“Nelson estaria achando estranho todas essas homenagens de centenário. Ele não era solene, não era o caminho dele. Por todo o seu minimalismo, pela sua destruição de excessos, Nelson não pode ser visto como um gênio tradicional, de uma maneira solene.”
“Ele é um dos maiores dramaturgos brasileiros de todos os tempos, mas o Nelson, mesmo assim, ainda é um pouco jogado para escanteio pelos cânones do teatro.”
“Ele não conhecia as normas de qualidade estética que se esperava. E é essa uma grande importância dele. Ter construído a sua obra através de uma certa ignorância.”
“Ele nunca leu muito. Sua formação foi a do jornalismo policial, muito factual. Ele trabalhava com as coisas mais banais do cotidiano. Via poesia nas coisas menos interessantes. Transformava o irrelevante em relevante.”
“Ele pedia água Lindoya só porque gostava do nome. Dizia: 'Que água bonita'.” “Nelson citava muito Deus. Dizia: ‘Se Deus me perguntar se eu fiz um bom trabalho, vou responder: ‘Valeu, Senhor! Acho que inventei o óbvio’.”
“Era um homem antimetáforas. Nunca procurava o sublime. Dizia: ‘Ela dava gargalhadas como uma bruxa de livro infantil’.”
“O Nelson é sempre associado com a sacanagem e a pornografia, mas só há um palavrão na obra dele, no segundo ato de 'Bonitinha mas ordinária'. Ele não tinha uma visão moderna da mulher, não gostava de mulher que falava palavrão.”
“Nelson me dizia que literatura é como jogo de futebol, e que o problema é que nenhum escritor brasileiro sabia bater escanteio."
“Odiava alegorias. Tirou a pose da literatura Brasileira. Queria dar sentido claro para as coisas. Ele secou a literatura dos seus excessos e adjetivos. Um faxineiro da literatura e do teatro.”
“Odiava quando Guimarães Rosa era chamado de gênio. Quando ele morreu, sentiu um alívio e foi para a janela fumar. Implicava com Fernando Pessoa. Desculpe, mas eu também.”
“Falávamos ao telefone todos os dias. Nelson não dormia bem. Ficava até tarde ouvindo ópera. Quando estava filmando 'Tudo bem' e ele me ligava às 3h da manhã, me chamava de burguês quando via que eu estava dormindo.”
“Nelson nunca saiu do país. No máximo foi até São Paulo. E dizia: 'Se eu passo 15 minutos do Méier já me sinto no exterior'. Ele tinha a apreensão do comportamento urbano carioca e brasileiro. Essa é maior importância dele.”
O GLOBO
31/08/2012
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