Governos
que se metem na vida dos outros são governos autoritários. Na história
temos dois grandes exemplos: o fascismo e o comunismo.
Em
nossa época existe uma outra tentação totalitária, aparentemente mais
invisível e, por isso mesmo, talvez, mais perigosa: o “totalitarismo do
bem”.
“Mas
a saúde é um bem público!”, dirá o clero dos limpinhos. Mas, contra o
que pensa o senso comum, em saúde, se você deixar de gastar dinheiro com
X, você gastará com Y. Sabe-se que em medicina, fora acidentes de carro
e semelhantes, se você não morrer de doenças metabólicas ou
cardiovasculares, você morrerá de câncer. Evite a forma de câncer que
você quiser, enfim.
A
saúde sempre foi um dos substantivos preferidos das almas e dos governos
autoritários. Quem estudar os governos autoritários verá que a “vida
cientificamente saudável” sempre foi uma das suas maiores paixões.
E,
aqui, o advérbio “cientificamente” é quase vago porque o que vem
primeiro é mesmo o desejo de higienização de toda forma de vício,
sujeira, enfim, de humanidade não correta.
Nosso
maior pecado contemporâneo é não reconhecer que a humanidade do humano
está além do modo “correto” de viver. E vamos pagar caro por isso porque
um mundo só de gente “saudável” é um mundo sem Eros.
O
filósofo Nietzsche já dizia que, depois da morte de Deus, o
ressentimento dos covardes iria buscar aconchego na ciência — e, por que
não, na saúde? O escritor inglês Aldous Huxley, autor da distopia “Admirável Mundo Novo“,
via na obsessão totalitária do utilitarismo (escola ética que definia o
bem como bem-estar da maioria) a tragédia da liberdade.
Em
sua maravilhosa descrição de um futuro maníaco por saúde e felicidade,
Huxley diagnostica a grande e insuspeita vítima do novo totalitarismo do
bem: a morte da liberdade em nome da felicidade limpinha do mundo.
O governo deveria deixar as pessoas sentirem o gosto que quiserem em suas bocas.
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