Na introdução à obra
História da Sexualidade II, Do Uso dos Prazeres, temos um texto
bastante feliz de Michel Foucault sobre o que vem a ser, de fato, a
filosofia. Um texto para ser lido, lido de novo e depois posto à
admiração de todos que puderem se abrir ao maravilhoso exercício
do pensamento. O que ele diz, do jeito que diz da filosofia é
simplesmente novo e contemporâneo. Aliás, Foucault é um desses
filósofos, cujo modo de dizer as coisas é praticamente atual,
singular e resistente ao tempo. Consegue ser contemporâneo o tempo
todo.
Se Foucault fez o seu
“ensaio” filosófico como o fez Montaigne, Nietzsche e outros,
por que não devamos fazer o mesmo a partir de nós? Vejamos o que é
o “ensaio” filosófico de Foucault para aprendermos a lição de
pensar o pensamento a partir do contemporâneo.
“Quanto ao motivo que me
impulsionou foi muito simples. Para alguns, espero, esse motivo
poderá ser suficiente por ele mesmo. É a curiosidade – em todo
caso, a única espécie de curiosidade que vale a pena ser praticada
com um pouco de obstinação: não aquela que procura assimilar o que
convém conhecer, mas a que permite separar-se de si mesmo. De que
valeria a obstinação do saber se ele assegurasse apenas a aquisição
dos conhecimentos e não, de certa maneira, e tanto quanto possível,
o descaminho daquele que conhece? Existem momentos na vida onde a
questão de saber se se pode pensar diferentemente do que se pensa, e
perceber diferentemente do que se vê, é indispensável para
continuar a olhar ou a refletir. Talvez me digam que esses jogos
consigo mesmo têm que permanecer nos bastidores; e que no máximo
eles fazem parte desses trabalhos de preparação que desaparecem por
si sós a partir do momento em que produzem seus efeitos. Mas o que é
filosofar hoje em dia – quero dizer, atividade filosófica –
senão o trabalho crítico do pensamento sobre o próprio pensamento?
Se não consistir em tentar saber de que maneira e até onde seria
possível pensar diferentemente em vez de legitimar o que já se
sabe? Existe sempre algo de irrisório no discurso filosófico,
quando ele quer, do exterior, fazer a lei para os outros, dizer-lhes
onde está a sua verdade e de que maneira encontrá-la, ou quando
pretende demonstrar-se por positividade ingênua; mas é seu direito
explorar o que pode ser mudado, no seu próprio pensamento, através
do exercício de um saber que lhe é estranho. O “ensaio” - que é
necessário entender como experiência modificadora de si no jogo da
verdade, e não como apropriação simplificadora de outrem para fins
de comunicação – é o corpo vivo da filosofia, se, pelo menos,
ela for ainda hoje o que era outrora, ou seja, uma 'ascese', um
exercício de si, no pensamento”(In FOUCAULT, Michel. História da
sexualidade II, Uso dos Prazeres. Rio de Janeiro: Ed. Graal, 1984,
pág. 13).
Compilado por Jackislandy
Meira de Medeiros Silva.
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