Por Jorge Forbes in Café
Filosófico CPFL Especial Fronteiras do Pensamento CPFL Cultura.
Estamos vivendo
momentos fortes de mudanças. Todos estão sendo afetados. São
mudanças que tocam do nascimento à morte. São mudanças do
nascimento à morte. São mudanças do nascimento quando estamos numa
época da engenharia genética e temos questões éticas sérias para
discutir sobre, por exemplo, o selecionamento de embriões. São
mudanças na educação; os professores estão desesperados, a
disciplina não funciona mais, os ideais até pouco tempo atrás;
vamos estudar, fazer um vestibular, entrar numa faculdade também não
é animador, não são animadores esses ideais para os estudantes.
Nós estamos vivendo
transformações importantes no amor. Transformações fundamentais.
As pessoas, hoje em dia, não têm mais nenhuma razão para estarem
juntas se não quiserem estar juntas. Não dá para explicar se você
está com alguém porque prometeu ao pai daquela pessoa; porque senão
sua parceira ou seu parceiro vão educar mal o seu filho; porque você
jurou no leito de morte pro seu sogro ou pro seu pai que ficaria com
aquela pessoa até o final de sua vida. Quem reclama de manhã com
quem está é porque é uma forma de declarar amor como outra
qualquer. Eu detesto você; você também me detesta, muito bem, bom
dia e prossigamos.
Nós temos mudanças
importantes no trabalho. Nos contaram que a gente ia se aposentar aos
50, 60 anos de idade, mas é mentira. A gente vai viver agora mais 40
anos e ninguém mais vai poder se aposentar nesta idade. Quando a
gente acha que chegou no auge, nós temos mais quarenta anos pela
frente. Nós temos um bando de adolescentes cinquentão perdidos por
aí sem saber o que fazer, como reinventar a sua vida. Faz parte
também das transformações atuais. E nós temos, hoje em dia,
controles que fazem, muitas vezes, esticar o momento da morte,
colocando sérios problemas para as pessoas, para suas famílias. Até
onde nós devemos deixar que a tecnologia aja sobre os nossos corpos,
às vezes, fazendo uma vida infinita que de sã consciência ninguém
gostaria de ter. Enfim, tudo isso faz com que nós estejamos sem
bússola, estejamos desbussolados no séc. XXI.
Como dar uma nova
bússola a este mundo? De que maneira interessou e muito o pensamento
de Luc Ferry sobre uma nova ordem para o pensamento humano? Luc Ferry
parte de uma ética e filosofia humanistas. Ele tem feito a clínica,
isto é, ele tem se debruçado sobre esta questão e organizado da
seguinte maneira. Num primeiro momento, ele nos diz que temos uma
bússola muito clara que é a bússola da natureza, uma bússola
cósmica, onde cada um tinha o seu lugar já pré-determinado: homens
aqui, mulheres aqui, crianças ali, senhores ali, escravos lá, e
assim por diante. De modo que as pessoas deviam somente se adequar a
esta posição. Uma ética cósmica, onde nós não precisávamos
duvidar, devíamos simplesmente nos adequar. Essa seria a primeira. A
segunda, por outro lado, corrige um defeito da primeira no sentido de
que faz com que todo mundo passe a ser igual. Que todos passem a ser
iguais frente a um Deus. Saímos então de uma ética cósmica e
entramos numa ética religiosa. Somos agora todos iguais frente à
primeira, que seria a socrática. Somos todos iguais frente a um ser
além de nós, que nos transcende. Essa ética dura bastante tempo,
até fim do séc. XVII e início do séc. XVIII, com o iluminismo,
onde ela vem substituída pela ética da razão. Sai Deus, onde
estava Deus entra a razão. Finalmente, chegamos ao século passado,
o século da desconstrução. Nada fica de pé. Nietzsche, Marx,
Freud, Lacan desconstroem todas as possibilidades de amarrações
para o ser humano. Nós ficamos sem caminhos, ficamos como dizia
agora a pouco, como que desbussolados. E nesse momento, o que fazer?
Nesse momento há um desespero enorme em nossa sociedade em setores
que num primeiro instante acharam ótima essa liberdade e começam a
ficar profundamente angustiados; vivemos um retrocesso em nossa
sociedade. Encontramos livros de autoajuda a cada esquina; vemos
neo-religiões dando respostas ultrapassadas a questões novas; e é
necessário pois fazer essa discussão que estamos fazendo agora. O
que é que propõe, enfim, nosso pensador Luc Ferry em seus livros?
Ele propõe um novo humanismo. Um novo humanismo. Ele acha que nós
temos que reinventar um humanismo, aquele humanismo do séc. XVIII.
Não que tenhamos agora que sacralizar a razão, mas o próprio
homem. Nós não morremos mais pela ideia de nação, nós não
morremos mais pela ideia de Revolução, nós não morremos mais pela
ideia de um Deus. Nem religião, nem guerra, nem revolução. Nós
podemos, sim, nos sacrificar por um outro homem. A palavra sacrificar
está na base do sagrado. A sacralização atual do próprio homem. E
propõe, portanto, uma espiritualidade laica. E não é verdade que
nós estejamos totalmente perdidos, que não há nada em nós além
de nós. Há alguma coisa além. Há uma transcendência da nossa
imanência. Aparentemente não cabe, mas se nós pensarmos, quanto
mais íntimos nós formos de nós mesmos, quanto mais próximos de
nós mesmos nós estivermos, mas estranhos nós vamos nos ver. Lacan
chamava isso de extimo. Talvez, se fossemos honestos mesmos conosco,
não diríamos nunca o meu íntimo, mas vez por outra seria melhor
dizermos o meu extimo. E esse meu extimo só ganha sentido no
confronto com o outro. Ou seja, na base última da imanência eu me
encontro com algo além de mim que é essa parte mesma de mim por mim
desconhecida em outro, razão que a gente se reúne, que a gente
conversa, que a gente discute como está fazendo agora.
Compilado pelo Prof.
Jackislandy Meira de M. Silva.
Muito interessante o
olhar do Prof. Jorge Forbes sobre os problemas da atualidade que são
revistos por uma nova filosofia humanista de Luc Ferry a partir da
ideia chave de sacrifício/sagrado.
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