“Vede que sou um arauto do raio e uma pesada gota que cai da nuvem. Mas esse raio se chama super-homem”. Nietzsche anuncia um além do homem que, mesmo tentando descrevê-lo no prólogo desta obra, não sabemos de fato quem é este homem ou este além do homem, porque ele é muito mais do podemos pensar sobre ele, é algo que a nossa razão não dá conta.
No entanto, essa obra escrita no final do século XIX, entre 1882 a 1886, mostraria marcadamente um período muito intenso de toda atividade literária de Nietzsche, uma vez que fora escrita em paralelo com outra grande obra de sua autoria, “A Gaia Ciência”. Logo após a criação dessas duas pérolas da Filosofia, surge uma outra que é contemporânea, não menos importante, “Para Além do Bem e do Mal”.
Certamente, “Assim falava Zaratustra” não é uma de suas obras das mais fáceis, haja vista o tom do autor carregado de metáforas, variados personagens e bastante profético.
Zaratustra atinge a todos com seu discurso, embora saiba que não estão nem aí pra ele, pois fala diretamente à Cultura, da qual temos grande orgulho, porque é o que nos diferencia dos pastores de cabras. Mesmo assim, insiste em falar. Seu desejo é anunciar. Falar de quê? Anunciar o quê? De algo desprezível, isto é, do último homem.
“Chegou o tempo para que o homem se fixe em um objetivo. Chegou o tempo para que o homem semeie o germe de sua mais elevada esperança. Para isso, seu solo é ainda bastante rico. Mas um dia pobre e árido será esse terreno e nele já não poderá germinar nenhuma grande árvore. Ai! Aproxima-se o tempo em que o homem já não lançará por sobre o homem a flecha de seu desejo e em que a corda de seu arco terá desaprendido a vibrar. Isso vos digo: é preciso ter ainda um caos dentro de si para gerar uma estrela que dança. Isso vos digo: tendes ainda um caos dentro de vós. Ai! Aproxima-se o tempo em que o homem jaó não conseguirá gerar estrela alguma. Aproxima-se o tempo do mais desprezível dos homens, daquele que já não pode se desprezar a si mesmo”(Nietzsche, Assim falava Zaratustra, pág. 21).
Até aqui já seria suficiente para julgar as palavras de Nietzsche acerca do possível homem que a humanidade iria vislumbrar. Que a humanidade iria gerar. Um homem além de seu tempo, mas muito mais desprezível do que antes. Há mais de um século distante de nós, Nietzsche fora capaz de se aperceber imbuído de um vigor fora do comum que o apoderou de si mesmo para intuir um além do homem que não conhece, independente, mas que não é o homem, disso ele tem certeza. Este além do homem não o homem. É algo a que ele aspira, que deseja ardentemente. Zaratustra continua incansável seu discurso:
“Olhai! Vou mostrar-lhes o último homem. Que é o amor? Que é a criação? O que é um desejo ardente? O que é uma estrela? Isso pergunta o último homem e pisca os olhos”(ibidem, pág. 22). Nietzsche coloca na boca de seu personagem, Zaratustra, ironia e verdades que nos chocam ainda hoje. O mundo passa constantemente pela escassez de homens criadores, amorosos, cheios de desejos, que procure uma estrela, enfim... Poetas, filósofos, artistas, professores, políticos, religiosos, padres, pastores... Onde estão vocês? É, de fato, um cala boca em todos aqueles que se denominam donos de uma cultura neoliberal, cuja finalidade é só o lucro, em que a base da economia é o dinheiro, a moeda. A crise econômica chegou a um colapso, a estágios mais do que urgentes devido ao interesse do homem em manipular seu dinheiro apenas para sua sobrevivência sem precisar trabalhar. Ganhar dinheiro com dinheiro, sem trabalhar. Esta é a dura realidade imposta por um modelo econômico neoliberal que se encontra em crise, em declínio. Mais uma fase do capitalismo chegando ao seu fim. Que homens queremos ser? A voz de Zaratustra soa em nossos ouvidos ainda hoje. É mais atual do que nunca!
Com toda sagacidade de Nietzsche, Zaratustra ainda tocou num grave problema de nosso tempo sem viver nesse tempo, saúde e doenças. A cultura da saúde idolatrou a cultura da beleza. Fazer exercícios físicos e duras dietas tornou-se obsessão para milhares de pessoas em todo o mundo. A prioridade deixou de ser a saúde para se tornar uma busca incontrolável pelo corpo esbelto. Quem é magro é belo. Quem é gordo é feio. Valores que mudaram a curto prazo. Somos escravos dessa cultura, modelos únicos que são seguidos por modismos sem nenhum tipo de reflexão, de crítica, de gosto, de respeito aos valores individuais. Apenas se aceita e se vive assim. Mas voltemos a Nietzsche. Socorra-nos, por favor.
“A terra se tornará então pequena, e sobre ela andará aos saltos o último homem, que torna tudo pequeno. Sua espécie é indestrutível como a do pulgão. O último homem será o que viver mais tempo. Descobrimos a felicidade – dizem os últimos homens e piscam os olhos. Abandonaram as regiões onde a vida era dura porque precisam de calor. Ainda amam o vizinho e se encostam nele porque uma pessoa necessita calor. Doença e desconfiança são, a seus olhos, pecado. Anda-se com toda a cautela. Insensato aquele que ainda tropeça nas pedras e nos homens! Vez por outra, algum veneno. É algo que proporciona agradáveis sonhos. E, no fim, muito veneno para morrer agradavelmente. Trabalha-se ainda porque o trabalho distrai. Mas toma-se cuidados para que a distração não se transforme em cansaço. Já não se sente necessidade de ser pobre ou rico. São duas coisas demasiado penosas. Quem quererá ainda governar? Quem quererá ainda obedecer? São duas coisas por demais penosas. Nenhum pastor e só um rebanho! Todos querem a mesma coisa, todos são iguais. Aquele que pensar de modo diverso, que encaminhe voluntariamente seus passos para o manicômio. Em outros tempos, todos eram loucos, dizem os mais perspicazes e piscam os olhos. Somos sábios e sabemos tudo o que se passou antigamente. Dessa maneira temos do que zombar sem cessar. Subsistirão ainda querelas, mas a reconciliação vem depressa, com receio de estragar a digestão. Não vai faltar um pouco de prazer durante o dia e outro tanto durante a noite. Mas reverenciar-se-á a saúde. Descobrimos a felicidade, dizem os últimos homens e piscam os olhos”(ibidem).
No entanto, essa obra escrita no final do século XIX, entre 1882 a 1886, mostraria marcadamente um período muito intenso de toda atividade literária de Nietzsche, uma vez que fora escrita em paralelo com outra grande obra de sua autoria, “A Gaia Ciência”. Logo após a criação dessas duas pérolas da Filosofia, surge uma outra que é contemporânea, não menos importante, “Para Além do Bem e do Mal”.
Certamente, “Assim falava Zaratustra” não é uma de suas obras das mais fáceis, haja vista o tom do autor carregado de metáforas, variados personagens e bastante profético.
Zaratustra atinge a todos com seu discurso, embora saiba que não estão nem aí pra ele, pois fala diretamente à Cultura, da qual temos grande orgulho, porque é o que nos diferencia dos pastores de cabras. Mesmo assim, insiste em falar. Seu desejo é anunciar. Falar de quê? Anunciar o quê? De algo desprezível, isto é, do último homem.
“Chegou o tempo para que o homem se fixe em um objetivo. Chegou o tempo para que o homem semeie o germe de sua mais elevada esperança. Para isso, seu solo é ainda bastante rico. Mas um dia pobre e árido será esse terreno e nele já não poderá germinar nenhuma grande árvore. Ai! Aproxima-se o tempo em que o homem já não lançará por sobre o homem a flecha de seu desejo e em que a corda de seu arco terá desaprendido a vibrar. Isso vos digo: é preciso ter ainda um caos dentro de si para gerar uma estrela que dança. Isso vos digo: tendes ainda um caos dentro de vós. Ai! Aproxima-se o tempo em que o homem jaó não conseguirá gerar estrela alguma. Aproxima-se o tempo do mais desprezível dos homens, daquele que já não pode se desprezar a si mesmo”(Nietzsche, Assim falava Zaratustra, pág. 21).
Até aqui já seria suficiente para julgar as palavras de Nietzsche acerca do possível homem que a humanidade iria vislumbrar. Que a humanidade iria gerar. Um homem além de seu tempo, mas muito mais desprezível do que antes. Há mais de um século distante de nós, Nietzsche fora capaz de se aperceber imbuído de um vigor fora do comum que o apoderou de si mesmo para intuir um além do homem que não conhece, independente, mas que não é o homem, disso ele tem certeza. Este além do homem não o homem. É algo a que ele aspira, que deseja ardentemente. Zaratustra continua incansável seu discurso:
“Olhai! Vou mostrar-lhes o último homem. Que é o amor? Que é a criação? O que é um desejo ardente? O que é uma estrela? Isso pergunta o último homem e pisca os olhos”(ibidem, pág. 22). Nietzsche coloca na boca de seu personagem, Zaratustra, ironia e verdades que nos chocam ainda hoje. O mundo passa constantemente pela escassez de homens criadores, amorosos, cheios de desejos, que procure uma estrela, enfim... Poetas, filósofos, artistas, professores, políticos, religiosos, padres, pastores... Onde estão vocês? É, de fato, um cala boca em todos aqueles que se denominam donos de uma cultura neoliberal, cuja finalidade é só o lucro, em que a base da economia é o dinheiro, a moeda. A crise econômica chegou a um colapso, a estágios mais do que urgentes devido ao interesse do homem em manipular seu dinheiro apenas para sua sobrevivência sem precisar trabalhar. Ganhar dinheiro com dinheiro, sem trabalhar. Esta é a dura realidade imposta por um modelo econômico neoliberal que se encontra em crise, em declínio. Mais uma fase do capitalismo chegando ao seu fim. Que homens queremos ser? A voz de Zaratustra soa em nossos ouvidos ainda hoje. É mais atual do que nunca!
Com toda sagacidade de Nietzsche, Zaratustra ainda tocou num grave problema de nosso tempo sem viver nesse tempo, saúde e doenças. A cultura da saúde idolatrou a cultura da beleza. Fazer exercícios físicos e duras dietas tornou-se obsessão para milhares de pessoas em todo o mundo. A prioridade deixou de ser a saúde para se tornar uma busca incontrolável pelo corpo esbelto. Quem é magro é belo. Quem é gordo é feio. Valores que mudaram a curto prazo. Somos escravos dessa cultura, modelos únicos que são seguidos por modismos sem nenhum tipo de reflexão, de crítica, de gosto, de respeito aos valores individuais. Apenas se aceita e se vive assim. Mas voltemos a Nietzsche. Socorra-nos, por favor.
“A terra se tornará então pequena, e sobre ela andará aos saltos o último homem, que torna tudo pequeno. Sua espécie é indestrutível como a do pulgão. O último homem será o que viver mais tempo. Descobrimos a felicidade – dizem os últimos homens e piscam os olhos. Abandonaram as regiões onde a vida era dura porque precisam de calor. Ainda amam o vizinho e se encostam nele porque uma pessoa necessita calor. Doença e desconfiança são, a seus olhos, pecado. Anda-se com toda a cautela. Insensato aquele que ainda tropeça nas pedras e nos homens! Vez por outra, algum veneno. É algo que proporciona agradáveis sonhos. E, no fim, muito veneno para morrer agradavelmente. Trabalha-se ainda porque o trabalho distrai. Mas toma-se cuidados para que a distração não se transforme em cansaço. Já não se sente necessidade de ser pobre ou rico. São duas coisas demasiado penosas. Quem quererá ainda governar? Quem quererá ainda obedecer? São duas coisas por demais penosas. Nenhum pastor e só um rebanho! Todos querem a mesma coisa, todos são iguais. Aquele que pensar de modo diverso, que encaminhe voluntariamente seus passos para o manicômio. Em outros tempos, todos eram loucos, dizem os mais perspicazes e piscam os olhos. Somos sábios e sabemos tudo o que se passou antigamente. Dessa maneira temos do que zombar sem cessar. Subsistirão ainda querelas, mas a reconciliação vem depressa, com receio de estragar a digestão. Não vai faltar um pouco de prazer durante o dia e outro tanto durante a noite. Mas reverenciar-se-á a saúde. Descobrimos a felicidade, dizem os últimos homens e piscam os olhos”(ibidem).
Cf.: NIETZSCHE, F. W. Assim Falava Zaratustra. São Paulo: Escala.
Jackislandy Meira de M. Silva,
Professor e Filósofo.
Confiram: www.umasreflexoes.blogspot.com
www.chegadootempo.blogspot.com
Um comentário:
Curtindo o blog nessa tarde, ótima seleção de temas e assuntos, composição de textos. Pretendo voltar. Parabéns
Abs
Miguel Duclos
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