“Mas eu penso que a relação do
estrangeiro com o estrangeiro, tornando-se amor e abnegação, atesta mais a
ordem de Deus. Sempre admirei, na Bíblia, a fórmula: ‘Amarás o estrangeiro’.
Essa relação pode se prolongar nas relações fraternais, mas é certamente na
relação com outro homem, em meus deveres, em minhas obrigações, em que lhe diz
respeito, que há, para mim, a palavra de Deus. É nesse ponto que a subversão
considerável da ordem natural se produz: alguém, que não me diz respeito, me
diz respeito, é bem isso o paradoxo do amor do estrangeiro. Inicialmente, ser,
é persistir em seu ser. É nesses termos que Spinoza entende a existência. Ser é
o esforço de ser, o fato de perseverar em seu ser. E eis de repente uma ruptura
desse esforço. Em minha responsabilidade no tocante a outrem, que logicamente
nada é, que é outro, que é separado, que é estrangeiro. Eu tenho essa
responsabilidade a partir do momento em que abordo o outro homem. Nesse
sentido, falo aqui da palavra de Deus que converte a perseverança em meu ser em
solicitude para com outrem”
POIRIÉ, François. Emmanuel
Lévinas: ensaio e entrevistas. São Paulo: Perspectiva, 2007, p. 99-100.
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