A lógica gramatical que rege nossa linguagem se sustenta na exclusão. Um dos princípios fundamentais do nosso discurso é chamado de "princípio do terceiro excluído". Posso dizer que eu sou, e posso dizer que eu não sou alguma coisa, mas não posso dizer que sou e não sou, ao mesmo tempo, alguma coisa. Isto, que parece apenas uma regra gramatical, produz uma cisão no modo como percebemos as coisas. Nossa linguagem cotidiana nos impõe que, ao falarmos, estejamos afirmando ou negando algo: ou estamos certos ou errados, diz a regra. Mas sabemos que estamos sempre, ao mesmo tempo, e de algum modo, certos e errados. Esse tipo de pensamento gerou o que Nietzsche entende por uma lógica da exclusão, um modo de pensar que segmenta, separa. O mundo contemporâneo, especialmente quando pensado como exaustão da modernidade, é um mundo que sofre as consequências dessa fragmentação: esquecemos o todo, destruímos o meio ambiente, as cidades, as relações humanas; mas esquecemos também de nós mesmos, vide a obesidade crescente, o uso indiscriminado de drogas e medicações psiquiátricas, os suicídios, os acidentes de carro.
A hiper valorização da imagem também trouxe suas consequências; ninguém corresponde ao corpo manipulado pelo photoshop, nem à vida glamorosa das propagandas de TV. Então sempre estamos aquém, mesmo quando atingimos o status tão ansiosamente sonhado. O que resulta em uma sociedade onde todos são, de algum modo, excluídos: os muito feios, os muito bonitos, os muito pobres e também os muito ricos, os muito gordos e também os muito magros, os muito tranquilos, mas também os muito agitados, todos, indiscriminadamente sofrem algum tipo de exclusão. Os milionários, os artistas, as celebridades, por exemplo, em função da violência indiscriminada, se isolam cada vez mais em condomínios fechados, em carros blindados, e não podem usufruir do que conquistaram. Não é à toa que homens como Warren Buffet e Bill Gates, tenham doado grande parte de seu patrimônio para causas sociais, ambientais. Ou aprendemos a lidar com aquilo que nos incomoda ou sucumbimos como sociedade, como humanidade. Incluir é a regra, e isso envolve o escuro, o medo da morte, as angústias, as perdas, a dor. Se aprendemos alguma coisa, nos últimos séculos, é que excluir não resolve, apenas acirra as contradições. Nada desaparece, em nossa lata de lixo social, tudo retorna, em forma de violência, exaustão ambiental, miséria e dor.
Psicóloga e psicanalista, especialista em elaboração de políticas públicas pela Universidade Federal do Espírito Santo. Mestra e doutora em filosofia pelo Instituto de Filosofia e Ciências Sociais da Universidade Federal do Rio de Janeiro.
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