sexta-feira, 25 de abril de 2008

Especulações acerca do mito



(a imagem ao lado nos reporta às narrativas dos trabalhos e os dias de Hesíodo – a caixa de Pandora – presente para todos os deuses)


“O mito é o nada que é tudo” (Fernando Pessoa).
O momento em que vivemos está sendo chamado por demais de Século do conhecimento. Só que nos esquecemos de discernir bem o que é, de fato, conhecimento, uma vez que conhecer, do latim cognoscere, significa trabalhar com nous, com a inteligência a ponto de estabelecer a diferença de uma coisa da outra. Ter noção de alguma coisa. Não é apenas assimilar ou ler informações rapidamente, onde a razão parece mais demente com o entra e sai de dados, de informações, do que com o refletir das causas em torno da realidade. O conhecimento tem que estar na direção da busca pelo saber, na medida do possível atrelado à Filosofia, em comunhão com a cogitação do pensamento, numa espécie de jogo do pensamento.
O modo como as coisas vieram a ser o que são ou como fora dado o ser ainda permanece sob suspenso na linha do conhecimento. Os limites da razão não nos deixam desvendar como, no fundo, são as coisas, pois nos diz Heidegger que nunca chegaremos a conhecer o que são as coisas, no máximo, chegaremos a dizer a sua aparência, jamais saberemos a sua essência. Para Wittgenstein, também não podemos mais ser filósofos porque não conseguimos mais trabalhar os conceitos de totalidade e essência. Esses conceitos não vão nos ajudar mais em nosso mundo. Daí o mundo ser caótico e desesperado.
No entanto, ousamos a denominar este tempo, de tempo do conhecimento. Onde estão as culturas que fundamentaram a linguagem e a escrita? Que lugar elas ocupam na dimensão do nosso conhecimento? Tivemos a petulância de tatuar as coisas, de imprimir-lhes significados, mas não lhes damos o devido valor. Os nossos ancestrais, no seu estado de natureza, como diria Rousseau, eram peritos em botânica, ecologia, geometria, agricultura, artes, enfim... Mas não foram honrados como gente do conhecimento. Souberam como ninguém a explorar racionalmente a natureza e a cantar as suas conquistas, glórias e paixões através do mito.
Anterior a qualquer tentativa de convenção categórica racional, o mito vem a ser a forma mais acabada de expressão humana sobre a vida, aquém e além dela. O que há de mais interessante é o fato de, com o mito, abraçarmos o que a razão, o logos não pode alcançar.
O vôo que se tem com a narrativa mitológica é extraordinário. Saborear o dizer de alguma coisa sem qualquer motivo de racionalização deve inserir-nos na dimensão do mistério, do sagrado, do religioso.
Platão nos oferece, depois de avançar nos níveis de conhecimento, uma maneira de descobrir também a verdade, a beleza e a idéia, o mito.
No pensar de Platão, não há uma separação entre mito e logos, no máximo pode haver uma distinção, o que não favorece a um e a outro.
Se o logos tende a explicar o surgimento de todas as coisas, isto não quer dizer que seja maior ou melhor que o mito, até porque este surge como tentativa de explicar a morte, o nascimento, a vida, os conflitos... O mito pretende muito mais do que podemos alcançar. O mito é sugestivo e um estímulo para o conhecer, pois não é um sistema pronto ou acabado, sem nada a acrescentar. O mito é responsável por provocar perguntas novas a respeito de tudo que nos cerca.
Em virtude disso, o pensador contemporâneo Edgar Morin afirma que “o mistério do mito invade o que o considera do exterior, enquanto, do interior, o mito é vivido não como mito, mas como verdade”.

Jackislandy Meira de M. Silva, professor e filósofo.
Confira os blogs:
www.umasreflexoes.blogspot.com
www.chegadootempo.blogspot.com

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Especulações acerca do mito



(a imagem ao lado nos reporta às narrativas dos trabalhos e os dias de Hesíodo – a caixa de Pandora – presente para todos os deuses)


“O mito é o nada que é tudo” (Fernando Pessoa).
O momento em que vivemos está sendo chamado por demais de Século do conhecimento. Só que nos esquecemos de discernir bem o que é, de fato, conhecimento, uma vez que conhecer, do latim cognoscere, significa trabalhar com nous, com a inteligência a ponto de estabelecer a diferença de uma coisa da outra. Ter noção de alguma coisa. Não é apenas assimilar ou ler informações rapidamente, onde a razão parece mais demente com o entra e sai de dados, de informações, do que com o refletir das causas em torno da realidade. O conhecimento tem que estar na direção da busca pelo saber, na medida do possível atrelado à Filosofia, em comunhão com a cogitação do pensamento, numa espécie de jogo do pensamento.
O modo como as coisas vieram a ser o que são ou como fora dado o ser ainda permanece sob suspenso na linha do conhecimento. Os limites da razão não nos deixam desvendar como, no fundo, são as coisas, pois nos diz Heidegger que nunca chegaremos a conhecer o que são as coisas, no máximo, chegaremos a dizer a sua aparência, jamais saberemos a sua essência. Para Wittgenstein, também não podemos mais ser filósofos porque não conseguimos mais trabalhar os conceitos de totalidade e essência. Esses conceitos não vão nos ajudar mais em nosso mundo. Daí o mundo ser caótico e desesperado.
No entanto, ousamos a denominar este tempo, de tempo do conhecimento. Onde estão as culturas que fundamentaram a linguagem e a escrita? Que lugar elas ocupam na dimensão do nosso conhecimento? Tivemos a petulância de tatuar as coisas, de imprimir-lhes significados, mas não lhes damos o devido valor. Os nossos ancestrais, no seu estado de natureza, como diria Rousseau, eram peritos em botânica, ecologia, geometria, agricultura, artes, enfim... Mas não foram honrados como gente do conhecimento. Souberam como ninguém a explorar racionalmente a natureza e a cantar as suas conquistas, glórias e paixões através do mito.
Anterior a qualquer tentativa de convenção categórica racional, o mito vem a ser a forma mais acabada de expressão humana sobre a vida, aquém e além dela. O que há de mais interessante é o fato de, com o mito, abraçarmos o que a razão, o logos não pode alcançar.
O vôo que se tem com a narrativa mitológica é extraordinário. Saborear o dizer de alguma coisa sem qualquer motivo de racionalização deve inserir-nos na dimensão do mistério, do sagrado, do religioso.
Platão nos oferece, depois de avançar nos níveis de conhecimento, uma maneira de descobrir também a verdade, a beleza e a idéia, o mito.
No pensar de Platão, não há uma separação entre mito e logos, no máximo pode haver uma distinção, o que não favorece a um e a outro.
Se o logos tende a explicar o surgimento de todas as coisas, isto não quer dizer que seja maior ou melhor que o mito, até porque este surge como tentativa de explicar a morte, o nascimento, a vida, os conflitos... O mito pretende muito mais do que podemos alcançar. O mito é sugestivo e um estímulo para o conhecer, pois não é um sistema pronto ou acabado, sem nada a acrescentar. O mito é responsável por provocar perguntas novas a respeito de tudo que nos cerca.
Em virtude disso, o pensador contemporâneo Edgar Morin afirma que “o mistério do mito invade o que o considera do exterior, enquanto, do interior, o mito é vivido não como mito, mas como verdade”.

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