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Às famílias das vítimas de Santa Maria/RS

Oremos pelas famílias atingidas na tragédia de Santa Maria/RS.
Que encontrem força, conforto e esperança no amor a Deus.

sexta-feira, 25 de janeiro de 2013

O filósofo Slavoj Zizek vem ao Recife/PE em março

O pensador esloveno, um dos mais polêmicos e famosos filósofos contemporâneos, vem a cidade fazer uma palestra e autografar seu novo livro

Publicado em 21/01/2013, às 11h24

Do JC Online

Filósofo virá ao Recife para lançar também o seu último livro, uma recuperação do pensamento de Hegel

Reprodução

O filósofo esloveno Slavoj Zizek, um dos críticos culturais e pensadores políticos mais conhecidos no mundo acadêmico atual, vem ao Recife no dia 15 de março. O teórico participa do evento ArtFliporto Apresenta, promovido pela Editora Carpem Diem em parceria com a Boitempo Editorial, que promove um debate para o lançamento da nova edição da revitsta de cultura e ensaios quadrimestral. O preço dos ingressos e o local da palestra ainda não foram divulgados. Ele ainda fará uma noite de autógrafos na cidade.
Zizek é talvez o mais pop dos filósofos contemporâneos, chamado também de "Elvis Presley da Teoria Cultural”. Professor da European Graduate School e pesquisador sênior no Instituto de Sociologia da Universidade de Liubliana, o esloveno tem uma forta atuação política em textos e em apoio a movimentos sociais como o Occupy Wall Street. Em março, ele vem lançar no Brasil o seu novo livro, Menos que nada: Hegel e a sombra do materalismo histórico, obra de mais de 900 páginas em que resgata a importância do pensamento de Hegel para entender o mundo atual.
“Ter Slavoj Zizek neste momento em que as redes sociais estão nos ajudando a pensar as formas de uso dos espaços públicos é fundamental. Slavoj Zizek é um provocador e com certeza o público recifense, que adora uma provocação, vai gostar da sua presença”, diz o jornalista e crítico literário Schneider Carpeggiani, editor da ArtFliporto.

quinta-feira, 24 de janeiro de 2013

Filme ‘Hannah Arendt’ retrata polêmica filósofa alemã

 

Foto: Divulgação
Depois de levar às telas Rosa Luxemburg e Hildegard von Bingen, cineasta Margarethe von Trotta aborda a pensadora judia teuto-americana em sua confrontação com o criminoso nazista Adolf Eichmann. Foto: Divulgação
A tese da “banalidade do mal” tornou Hannah Arendt famosa. A filósofa judia nascida na Alemanha abandonou o país em 1933, devido ao avanço do antissemitismo. Como repórter, viajou em 1961 a Jerusalém, para assistir ao processo contra o nazista Adolf Eichmann.
Na posição de obersturmbannführer (equivalente a tenente-coronel) da SS – organização policial-militar do partido nazista – ele organizara a expulsão, deportação e extermínio dos judeus europeus. O ainda jovem Estado de Israel o sequestrara para fora da Argentina, numa operação espetacular. Como a maioria dos espectadores, Arendt esperava encontrar no tribunal um monstro humano, através do qual o mal se manifestava.
No entanto, se deparou com um burocrata, um criminoso de escrivaninha, cuja banalidade a surpreendeu. As reportagens que escreveu da sala do tribunal foram objetivas, frias e perturbadoras. Os críticos a acusaram de indiretamente fazer das vítimas corresponsáveis ao dizer que teriam se comportado de maneira excessivamente passiva ou até cooperativa.
Na “desdemonização” de Eichmann feita por Arendt, muitos observadores viram uma minimização da periculosidade do réu. Na verdade, ela argumentava como a filósofa, a pensadora que foi durante toda a vida. Seu modo de ver o mundo gerou controvérsia, fazendo com que até mesmo amigos e companheiros se afastassem.
É justamente essa controvérsia que compõe o núcleo do filme Hannah Arendt, de 2012. A cineasta Margarethe von Trotta criou uma obra sensata e equilibrada. A atriz Barbara Sukowa incorpora o papel principal com alto grau de concentração. A era do pós-guerra e o clima entre imigrantes alemães e judeus em Nova York são capturados com precisão.
Por que as teses de Arendt chocaram a opinião pública e sobretudo os intelectuais de 50 anos atrás a tal ponto? Von Trotta atribui isso à maneira, então muito difundida, como diversos observadores judeus do processo mostravam sua dor e luto abertamente. Isso era algo que a filósofa teuto-americana não fazia. “Arendt não expressava sua dor, coisa que as pessoas não entendiam. Para ela, isso seria uma falta de compostura”, argumenta a diretora.
 
Importância de Heidegger
Nascida em 1906, Arendt cresceu num lar judaico secular. Ainda moça, foi estudar Filosofia e conheceu o filósofo alemão Martin Heidegger, cujas aulas eram disputadas sobretudo pelos estudantes mais jovens.
O filme que leva o nome da filósofa e se desenrola principalmente na década de 1960 dá destaque ao grande pensador Heidegger, por meio de breves flashbacks. Para Von Trotta, um ponto importante. “Ele lhe ensinou, de fato, como pensar. Ela própria disse: ‘Pensar pode salvar a pessoa das opções erradas e das catástrofes’. Heidegger tinha que estar no filme. Não como amante, mas sim como alguém que a ensinou a pensar.”
A produção Hannah Arendt apenas sugere que houve uma breve e apaixonada relação amorosa entre os dois filósofos. De um modo geral, a diretora evitou abordar os diversos estágios da vida de Arendt – como gostam de fazer os norte-americanos em seus filmes biográficos, os chamados biopics. Em vez disso, preferiu enfocar uma época essencial da vida da protagonista.
Duas decisões artísticas de Von Trotta tornam o filme especialmente consistente. A atriz Barbara Sukowa fala inglês diversas vezes, com forte sotaque alemão, como fazia Arendt. Curioso é que a alemã vive há mais de 20 anos em Nova York e teve que treinar esse sotaque. Essa opção consciente pelo bilinguismo é vantajosa para o retrato cinematográfico.
A segunda decisão importante foi a de não colocar um ator no papel de Adolf Eichmann, mas sim mostrá-lo exclusivamente em sequências originais da época. Para tal, Von Trotta recorreu a tomadas que já haviam sido utilizadas pelo cineasta franco-israelense Eyal Sivan em seu Un spécialiste, portrait d’un criminel moderne, de 1999.
A cineasta alemã já conhecia esse documentário bem antes de qualquer plano para um filme de ficção sobre Arendt e o processo contra o criminoso nazista. “Para mim, a confrontação com Eichmann foi muito importante. Por isso, não peguei nenhum ator, mas sim incluí o verdadeiro Eichmann. Eichmann, o irrefletido: ele não faz uso do dom de pensar.”
Outro motivo para a decisão foi evitar que o público se concentrasse no desempenho do ator e não percebesse o que a filósofa viu na época: um criminoso assustadoramente banal, que sempre tentou se projetar como mero executor de ordens.
Como retratar uma pensadora?
Durante os preparativos para a produção Rosentrasse, de 2003, Von Trotta teve pela primeira vez a oportunidade de se ocupar de forma mais detalhada com Arendt. O filme aborda um caso isolado de coragem civil, em que as esposas de judeus presos conseguiram forçar os nazistas a ceder, através de protestos continuados. Em suas pesquisas, a diretora deparou-se com textos da filósofa teuto-americana.
Von Trotta conta que, de início, não estava muito convencida quanto à ideia de filmar momentos da vida de Arendt. Com outras mulheres famosas que colocou na tela, fora diferente: o interesse por Rosa Luxemburg ou Hildegard von Bingen existiu desde o início.
Quando um produtor amigo propôs que ela fizesse um filme sobre Arendt, sua primeira reação foi recuar. “Como descrever uma filósofa?”, pensou. Só muito lentamente estabeleceu-se uma relação mais próxima com essa mulher fora do comum, que tantas vezes escandalizou e provocou.
Aonde o vento leva
Arendt passou boa parte de sua vida fora da Alemanha, embora não tenha abandonado a terra natal voluntariamente. Aqui, Von Trotta identifica paralelos consigo mesma, que viveu longo tempo em Roma e reside em Paris há vários anos.
“Eu mesmo fui apátrida durante muito tempo. Nasci em Berlim e durante anos só tinha um passaporte de viagem.” Somente após seu primeiro casamento, a cineasta obteve também documentos alemães.
Von Trotta sente-se ligada à Arendt nesse aspecto, o de “poder viver aonde o vento a leva, por não ser tão apegada ao próprio país”. Mas a diretora também reconhece um aspecto contraditório nessa relação com a filósofa: “Não me sinto parte, mas quero compreender”.
 
 
Por si, a matéria já anuncia o que poderá fruir dos nossos sentidos ao assistirmos a um filme tão impactante pelo conteúdo e certamente pela história de conhecimentos e descobertas da filósofa Hanna Arendt. Sem dúvida, o filme nos guarda belíssimas surpresas!

Cultura não justifica descaso.


Dar importância ao futebol não significa virar as costas para as necessidades mais urgentes do país, como água, comida e educação.

Homens que não bancam




Em dias de preguiça de verão, vi um filme desses de cujo nome ninguém se lembra. Férias devem ser assim: nada fazer e quando fizer, fazer nada. Mede-se a liberdade de uma pessoa pela capacidade que ela tem de fazer nada nas férias sem sentir aquele apelo de classe média de “fazer algo nas férias”.
Mas eis que um filme me chamou atenção pela temática: o problema que é quando o homem vive sustentado pela mulher. O personagem em questão pergunta para uma advogada que o está defendendo num caso: por que homens aos montes sustentam financeiramente mulheres, e o contrário é visto com maus olhos?
A questão é que homens que pegam dinheiro de mulher são vistos como maus-caracteres. E ponto final. Não seria esse mais um preconceito que deveríamos combater, assim como achar que os ratinhos não têm alma?
Antes de tudo, devo avisar às sargentas de plantão de que pouco importa que estatísticas apontem muitos casos de mulheres que sustentam famílias nas classes C e D (normalmente são mães sozinhas). Quando eu era estudante de medicina na Universidade Federal da Bahia e dava plantão em cidades paupérrimas no interior do Estado, atendia quatro mulheres ao mesmo tempo (aquele tipo de experiência que a esquerdinha dos jantares inteligentes paulistanos morreria de medo de ter, mas mente dizendo que se importa com o sofrimento no mundo). Mulheres assim se apresentavam como “largadas de marido”.
Tampouco os “inteligentezinhos” devem perder seu tempo falando que seu terapeuta corporal vive muito bem cozinhando para a esposa médica na casa deles em Cotia. A questão do personagem merece atenção para além das modinhas. Homens assim são chamados “homens que tiram dinheiro de mulher”. A questão é: por que ainda hoje homens assim são malvistos? Por que se olha para eles com suspeita de que sejam maus-caracteres?
Claro que existem exceções, isto é, casais que vivem bem com arranjos assim; mas o fato é que esses arranjos costumam ter prazo de validade curto. E muitas brigas versam sobre essa “situação”.
Esse normalmente é aquele tipo de tema sobre o qual não se fala em famílias educadas ou entre pessoas que fingem que o mundo mudou depois dos anos 1960. Este tipo então é muito engraçado.
A verdade é que, mesmo que bem-sucedidas, mulheres que sustentam seus parceiros sentem, no silêncio do cotidiano, ou na agonia de ter que pagar as contas no final mês, um gosto amargo de solidão na boca. Seria idiota imaginar um homem que sustenta sua mulher sofrer por se sentir “só” na função de provedor da família. Por que as mulheres se sentem sozinhas nessa situação, e os homens não?
Mas nossa heroína se pergunta: será que eu não mereço mais? Por que justo eu não consigo que meu parceiro me “banque”?
O mais duro é que mesmo em casos comuns nos quais os casais dividem os gastos, essas mulheres, que dividem os gastos, também “invejam” aquelas que têm maridos que “bancam”. Há casos em que mesmo que elas não precisem, gostariam de ter maridos que “banquem”. Eis o príncipe eterno. Todas o querem.
Aliás, o verbo “bancar” (e sua ambiguidade entre “sustentar”, “enfrentar situações difíceis” e o substantivo “banco”, lugar de dinheiro) vem muito a calhar. É comum dizer que, em casos nos quais a mulher tem muita grana, isso nunca é um problema. Acho que sim, mas nem tanto. Se ele não a banca financeiramente, porque ela de fato não precisa, ele terá que bancá-la em outro lugar. A mulher sempre quer “ser bancada”.
O incômodo feminino com homens “que não bancam” parece passar não só pela falta de grana (essa é apenas a mais universal das referências), mas essencialmente pelo problema do homem que “não tem atitude”. “Ele podia pelo menos se mexer…”, diria nossa heroína. Logo ela perderá o respeito por ele. Seria a causa biológica ou cultural?
Se a mulher séria tem de provar que não dá por aí, o homem sério tem de provar que não quer pegar dinheiro de mulher. Eis dois limites do blá-blá-blá contemporâneo. Mesmo que façam pose de bem resolvidas bancando seus homens, essas mulheres sofrem com isso e estão mentindo.

Luiz Felipe Pondé (jornal FSP – 21.01.2012)  | Outra fonte para este artigo: AQUI

terça-feira, 22 de janeiro de 2013

A proximidade de nossas relações

Aprendi que quanto mais nos aproximamos de Deus, mais parecemos com Ele. Quanto mais nos aproximamos das estrelas, mais parecemos com elas. Engraçado, mas descendo gradativamente nessa visão, é possível dizer ainda que quanto mais nos aproximamos das pessoas, mais nos parecemos com elas; quanto mais nos aproximamos dos nossos pais, mais nos parecemos com eles; quanto mais nos aproximamos dos nossos amigos, também parecemos com eles; quanto mais nos aproximamos de nossas esposas e vice-versa, mais nos assemelhamos a elas.
Descendo escada abaixo, o procedimento é o mesmo. É possível fazer essa relação de proximidade com tudo na vida, inclusive com as coisas, com o mundo, com as estruturas sociais, políticas e culturais de um modo geral. Embora se diga o contrário em alguns casos, o elemento aproximativo é fundamental para não só conhecermos com quem estamos lidando, mas com quem escolhemos para nos aproximar, para nos relacionar.
Esta mesma forma de aproximação se dá também com um livro, um animal de estimação, um filme, uma história, uma ideia, enfim. Quanto mais me aproximo de um livro, mais me pareço com ele. Quanto mais me aproximo de uma ideia, mais me assemelho a ela.
Imersos neste emaranhado de relações, seja com pessoas ou coisas, não estamos imunes aos conflitos, às injustiças e às incoerências deste mundo, pois reagimos de alguma forma. Mesmo quando não reagimos externamente ou fingimos não reagir, ainda assim reagimos positiva ou negativamente. E por mais que conheçamos as pessoas, o próprio mundo e Deus por essa cadeia de proximidades, não quer dizer que os riscos de uma traição, de uma certa leviandade ou de golpes de crueldade não parem de nos ameaçar, até porque nunca somos traídos por estranhos.
Na maior parte das vezes, nossas aproximações também denunciam com quem ou com o quê queremos parecer, com quem nos assemelhamos. Obviamente que aceitamos o contraditório, uma vez que nem todo mundo se parece com quem anda, com quem se relaciona ou com quem tem certa amizade. Todo cuidado é pouco, pois com o passar do tempo somos levados, até involuntariamente, a nos parecermos com o outro, cada vez mais íntimo e próximo de nós.
O nível de aproximação, claro, pode evitar uma série de investidas negativas contra nós, porém a mesma aproximação pode nos fazer entender que não são com todas as coisas ou pessoas que queremos parecer. Ou seja, não é bom parecermos com tudo que nos aproximamos, visto que muitos de nós não queremos parecer com o traidor, com o maldoso, com o perverso e o saguinário.
Penso que aproximar-se é, na verdade, uma tarefa importante para aqueles que se sentem parte do mundo das intrincadas relações sociais, onde muita coisa é meio obscura, sinistra e enganosa. Não há modo mais eficaz, talvez, de desmascarar as coisas do que participar delas de perto. Diria até que a proximidade do cidadão às instituições sociais pode diminuir o nível de corrupção política nessas instâncias, mesmo sabendo que, ao nos aproximarmos destas pessoas, não gostaríamos de nos parecer com elas.

Ilustração: Alessandro Sbampato in [em] Revista nº 12
Prof. Jackislandy Meira de M. Silva

Especialista em Metafísica, Licenciado em Filosofia, Bacharel em Teologia e


Pós-graduando em
 

Estudos Clássicos pela UNB e Archai Unesco.





segunda-feira, 14 de janeiro de 2013

Reservatórios da ética secaram!

Ótima comparação com a seca! Além da falta d'água para matar a sede e diminuir a inflação, precisamos matar a sede de ética! Não só água, mas falta ética no Brasil...

Cortella: "Censura nunca é bom"

"As novas gerações precisam ser educadas para conviver com o que está por aí". Vejam a abordagem de Mário Sérgio Cortella pela rádio CBN:






Fonte: http://cbn.globoradio.globo.com/comentaristas/mario-sergio-cortella/2013/01/10/CENSURA-NUNCA-E-BOM.htm

"Chefe é um homem que precisa dos outros" afirma Cortella

Segundo Mário Sérgio Cortella, o chefe é um homem que precisa dos outros. Pela rádio CBN, veja o quanto seu chefe pode ser tripudiado pelos outros, de modo que falar mal do superior parece ser um esporte nacional.

Rádio CBN: "Não se pode justificar tudo pela cultura"


Uma maravilhosa discussão entre Viviane Mosé, Carlos Heitor Cony e Artur Xexéo sobre o casamento e o dote em diferentes culturas? Há como interferir na cultura ou simplesmente acomodar-se a ela? Assistam à gravação!

quinta-feira, 10 de janeiro de 2013

Luiz Felipe Pondé: Acumular conforto não ajuda em nada

A sociedade contemporânea é baseada na tecnologia do conforto. Mas basta uma tempestade com enchente ou um ataque em uma escola para essa segurança se dissolver. O assunto é destaque do comentário do colunista da "Ilustrada" Luiz Felipe Pondé.
Segundo ele, surgem teorias de todos os lados para explicar as catástrofes muitas vezes recorrentes e com razões óbvias.
"Não adianta acumular conforto. Quando acreditamos estar seguros, ai surgem mais medos", afirma o filósofo.

Fonte: http://www1.folha.uol.com.br/multimidia/podcasts/1206589-luiz-felipe-ponde-acumular-conforto-nao-ajuda-em-nada.shtml

quarta-feira, 9 de janeiro de 2013

Reflexões veranis


(foto: 1000 homenzinhos de gelo da brasileira Nele Azevedo)

Somos tipicamente ou atipicamente forjados pelo verão, principalmente agora com essa loucura de elevadas temperaturas que chegam a nos sufocar em dias de baixa umidade de ar. Para quem mora no sertão nordestino, acostumado a muito sol e pouca água, feito um de nós, rapidamente nos adaptamos a esta atmosfera equatorial comum em países como o Brasil.
O clima influencia diretamente em nossa cultura, no cotidiano e em nosso modo de viver, basta vermos como nos vestimos, o que comemos e o que fazemos. Verão aqui é basicamente o ano todo! Vivemos num país que não vê mais a passagem de uma estação à outra. Esse fenômeno era visto somente no sertão nordestino, pois íamos do verão ao inverno, do inverno ao verão o tempo todo. Agora, não só o Nordeste, mas o Brasil inteiro experimenta como é viver num país de uma estação só.
Como disse, somos forjados pelo verão. De dezembro a fevereiro, do Natal ao Carnaval, o cidadão brasileiro, seja ele nordestino, gaúcho ou carioca, é exposto ao calor do sol das sucessivas festas que ocorrem justamente nesse período. Um verão com cara de sol literalmente e metaforicamente, pois é tempo de férias, fazer boas viagens, sair com a família, passear, divertir-se, celebrar e etc. Para alguns, o verão parece refletir a alma do brasileiro que gosta de carnaval e futebol. Para outros, significa o esvaziamento de si mesmo, a perdição da alma.
Na verdade, uma grande maioria se permite demais quando está vivendo estes momentos de alta sensação de liberdade. Na mesma proporção em que o calor aumenta, as ações impensadas também aumentam na vida do cidadão. A sensação de intensidade e imediatez que o verão evoca na mente do jovem e de outras pessoas é impressionante. Há que se ter muito cuidado com isso. Não é agora e nem nunca que você vai beber toda a bebida do mundo. Do contrário; você pode não beber. Não é agora que você precisa sair com todas as mulheres do mundo; você pode esperar. Não é agora que você tem de consumir tudo; você pode economizar. No verão, as pessoas se permitem a tudo perdendo a noção de medida, de sobriedade!
Ou seja, o verão vem se tornando, com o passar do tempo, por coincidir com as férias, com 13º salário, com o carnaval e etc., uma concorrência desleal consigo mesmo do “salve-se quem puder”, numa espécie de “happy hour”, momento feliz em que é preciso aproveitar tudo deste período custe o que custar. Até o corpo é trabalhado para o verão; muita malhação e pouca comida. Se já não há limites para a ditadura do corpo, imagine no verão. Para satisfazer os prazeres do corpo, tudo vale, tudo é permitido, não sobra tempo para mais nada em meio às parvoíces veranis.
O que sobra? Nada. Aí está o risco que muitos correm no verão: perder o controle da vida. No vale tudo da vida deste breve verão, que tem dia e hora para acabar, não vale a pena expor-se ao sol da promiscuidade sexual, das drogas, do consumismo exagerado, do desperdício e, muito menos, do vaivém de aventuras tão próprias a este relativo período, uma vez que possa ser mais difícil desacelerar até voltar ao ritmo natural de outras estações do ano; voltar ao controle da vida.


Prof. Jackislandy Meira de M. Silva

Bel. em Teologia, Licenciado em Filosofia, Esp. em Metafísica e Pós-graduando em Estudos Clássicos pela UnB/Archai/Unesco.





terça-feira, 8 de janeiro de 2013

De Pondé: Intimidade

Duas coisas me encantam: o amor e a intimidade. Sou daquele tipo de pessoa que tem preconceito contra quem não é capaz de se sujar de intimidade.
Sou um homem de obsessões. Uma delas é que não controlamos a vida. Mas, mesmo assim, devemos tentar ter algum controle sobre ela. Ao final, sempre somos derrotados. Se pensarmos nisso, nada vale a pena. Mas, antes da morte, tudo vale a pena justamente porque nunca venceremos a batalha. Não há qualquer outra dignidade na vida além da do herói épico que combate 1 milhão de inimigos.
Revi o maravilhoso "Revelações", com Anthony Hopkins (Coleman Silk) e a bela Nicole Kidman (Faunia Farley). O filme é baseado no romance de Philip Roth "A Marca Humana".
Este romance guarda um segredo que não deve ser revelado, sob pena de destruir seu impacto. Ele devia ser lido por todo mundo acometido da doença do século: a superficialidade de alma. Não se combate essa doença com alguma teoria sobre a vida (como pensam os superficiais ilustrados), mas unicamente com o mais puro
impasse.
Silk é um "scholar" de literatura que tem sua vida destruída porque usa a palavra "spook" ("fantasma", mas que tem um segundo possível significado, "negro", no sentido pejorativo) para dois alunos que nunca iam à aula.
Apesar de que ele não os conhecia, e, portanto, não sabia que eram negros, os dois alunos "se ofendem" mortalmente e, por isso, Silk sofre um processo na universidade por racismo. É humilhado por seus colegas. Pede demissão. Sua mulher morre do coração de desespero. Ele tem sua vida arruinada. A universidade, como sempre, quanto se trata de política, é o pior antro de canalhas da face da Terra.
Intelectuais são os "comissários do povo" mais temíveis da história. Comissários do povo eram canalhas comunistas que serviam a ideologia do partido. Intelectual com ideologia deve ser evitado como uma praga.
Sou um vocacionado à tristeza, mas resisto bem. As pessoas a minha volta sempre me salvam, mesmo que sem querer. Livros e filmes como esses me deixam felizes porque vejo neles o que vejo em mim: o sentido da vida que brota do fracasso, do impasse.
Roth sempre narra como indivíduos são esmagados por processos históricos. Neste caso, a hipocrisia neopuritana que se alimenta do antirracismo, fruto imundo da luta pelos direitos civis nos EUA, e que corrói a universidade como uma "peste do bem". Todos devem provar que não têm preconceitos (como em outros tempos teriam que provar a fidelidade ao partido ou a pureza racial) e, por isso, as palavras e os gestos são controlados no detalhe.
Coleman e Faunia se apaixonam. Ele, um velho deprimido ("Graças a Deus inventaram o Viagra"), ela, uma jovem pobre desgraçada, faxineira, com três empregos, que "matou seus filhos" num incêndio, espancada pelo marido, abusada pelo padrasto, abandonada pelos pais.
Todos são contra. Seus amigos, ex-amigos, inimigos, advogado. Ele é acusado de abusar de uma mulher jovem e pobre. Mulheres mais velhas odeiam quando mulheres mais jovens se apaixonam por homens mais velhos. Ela é acusada de querer dar o golpe da barriga. Ele é culto e sofisticado, ela fala "to fuck" ao invés de "fazer amor". Vulgar, se veste mal e limpa a merda dos outros o dia todo, todos os dias.
Mas eles têm aquele tipo de amor que brota dos restos do gozo e da intimidade suja, do afeto úmido que mora entre as pernas das mulheres. Um microcosmo no qual o materialismo vence sua pobreza. Uma vitória do corpo sobre o medo.
O filme é uma profunda prova do fracasso do sentido das coisas. Tudo na narrativa constrói a destruição do sentido da vida. O único lugar onde Coleman e Faunia existem é na solidão gloriosa do sexo.
Num dado momento ela chama a atenção dele para que tudo que existe entre eles é sexo. Ele insiste que não. Ela diz para ele que ele pensa assim porque não faz sexo há muito tempo.
A intimidade física entre uma mulher e um homem é de fato uma das maiores experiência da vida. Em meio aos restos dela, no encontro entre a saliva e o sexo, podemos encontrar alguma alma que valha a pena.


Luiz Felipe Pondé Luiz Felipe Pondé, pernambucano, filósofo, escritor e ensaísta, doutor pela USP, pós-doutorado em epistemologia pela Universidade de Tel Aviv, professor da PUC-SP e da Faap, discute temas como comportamento contemporâneo, religião, niilismo, ciência. Autor de vários títulos, entre eles, "Contra um mundo melhor" (Ed. LeYa). Escreve às segundas na versão impressa de "Ilustrada".

Fonte: http://www1.folha.uol.com.br/colunas/luizfelipeponde/1210827-intimidade.shtml

segunda-feira, 7 de janeiro de 2013

Slavoj-Zizek e suas ideias provocativas



Toda irreverência e sagacidade do filósofo esloveno que, juntamente com Alain Badiou, é um dos mais enfáticos na defesa do comunismo, além de trabalhar com a ideia de filosofia refletida na arte, na literatura, no cinema, na política, ao ponto de torná-la cada vez mais acessível não a ela mesma, mas, sobretudo, ao mundo.

Veja esta entrevista do filósofo Zizek com suas ideias provocantes.

Imperdível!

domingo, 6 de janeiro de 2013

De Chirico e o sentimento de sua obra

Por Maddalena d’Affonso

JANELA AO MAR Balaustrada de brisa para apoiar minha melancolia esta noite (Giuseppe Ungaretti, Versa, 22 de maio de 1916)

 
Giorgio De Chirico assume como universo simbólico de sua busca artística a cidade e seus cenários arquitetônicos, entre os quais coloca, de maneira ponderada e erudita, figuras, imagens, esboços e objetos quase como elementos alógenos que, justapostos, aludem ao enigma da modernidade.

Para De Chirico a modernidade é precisamente um novo classicismo; é desejo de um mundo novo, onde se possa agir livremente e livremente se deixar dominar por sentimentos humaníssimos, pelo medo, pela coragem; um mundo onde a liberdade de agere et pati (agir e sofrer) sublime a percepção opaca e desordenada do espaço em visões límpidas e lacônicas.

A ideia de uma humanidade renovada, de um "homem novo", que naqueles anos ia transformando a concepção do mundo, aplicando às artes uma insólita matriz interpretativa - na poesia, por exemplo, com Guillaume Apollinaire; na música, com Alfredo Casella; na cenografia, com Adolphe Appia; e na arquitetura, com Le Corbusier -, se confronta em De Chirico com uma única e pálida certeza: o sedimento da cultura na história e na civilização, o único que não se possa recusar, se consolida essencialmente na arquitetura, porque ela representa para o indivíduo a dimensão civil, exprimindo-se com maior evidência na praça urbana.

Esta de fato define o lugar ideal - seja ele foro, templo, pórtico, torre, sala - em que, segundo De Chirico, nos apropriamos da modernidade, seguros de uma consciência nova, ou seja, de sermos capazes de procurar respostas não só com a razão e seus ordenamentos regulados, mas também com a sensibilidade e com a poesia, entendida como poiesis, isto é, ato criativo.

Entretanto a enigmática modernidade de De Chirico, na qual certamente se percebe um eco nietzschiano, não delineia um mundo ideal, abstrato, metafísico, de verdades absolutas, mas substancia o fulcro de uma investigação artística que escancara ao nosso olhar a visão de uma realidade cíclica, mutável e ainda assim constante, como suspensa no tempo dos eternos retornos, propondo-a como fundamento de um conhecimento comum.

O espaço urbano, indagado e examinado ao longo de toda sua obra, dos anos de juventude ao retorno final aos temas da metafísica, se manterá como território por excelência do enigma, da dúvida e do assíduo interrogar-se humano, argumento que serve de trânsito da arte do passado, investigada na reatualização, entre outros, de Dürer e Rubens, dois de seus muitos mestres, à arte moderna, abrindo novas perspectivas de pesquisa.

A visão do mundo de De Chirico, em que a vivência pessoal é indissociável da construção do espaço urbano, torna sua experiência artística ainda hoje muito atual e próxima de nossa sensibilidade.

De fato, isenta como é das sugestões psicanalíticas próprias do surrealismo, ela propõe o confronto com a eloquência nítida de lugares arquetípicos, sólidos, definidos, restituindo assim ao sujeito aquela centralidade que, transmitida pela tradição clássica, é herdada pelas novas vanguardas e também está na base de experiências mais próximas a nosso tempo, como a dos situacionistas; com efeito, eles identificam justamente na cidade o pressuposto de uma reforma do sentir comum, que tenha como fundamento a inventividade do sujeito ativo.




Interno metafísico com rosto de Mercúrio, 1969 óleo sobre tela 80 x 60 cm


A cidade e o cenário arquitetônico urbano
 

"Na construção da cidade, na forma arquitetural das casas, das praças, dos jardins e das paisagens, dos portos, das estações ferroviárias etc., estão os primeiros fundamentos de uma grande estética metafísica. Os gregos tiveram certo escrúpulo nessas construções, guiados por seu senso estético-filosófico: os pórticos, os passeios sombreados, os terraços erguidos como plateias diante dos grandes espetáculos da natureza (Homero, Ésquilo); a tragédia da serenidade."1

A cidade de De Chirico é cidade grega, renascentista e moderna ao mesmo tempo: por isso foi amada por Breton como o espaço surreal, onde atravessam simultaneamente o vapor de uma locomotiva e a vela quadrada de uma trirreme homérica. A cidade é alçada por ele a motivo principal de suas representações, como se devesse desvelar sua raiz etimológica: civitas, a mesma de civilização; e de fato ela não é contemplada, contrariamente às aparências, em seu aspecto monumental: a praça, a rua, a perspectiva em claro-escuro do pórtico, o despontar da torre se inspiram não só em referências históricas concretas, mas também em arquétipos, aos topoi que subjazem a qualquer figura arquitetônica, densos de valor semântico, iconográfico, simbólico e cultural.

Sua cidade não é real, mas composição onírica de elementos derivados da iconografia urbana histórica, aberta à compreensão do indivíduo moderno, a fim de que desvele seu sentido oculto e confie a ela os próprios valores e os próprios sentimentos. Em verdade suspensos no sonho, os fragmentos de Florença, Roma, Turim, Munique, Ferrara, Paris Nova York não são senão sentimentos de cidades, sentimentos que sugerem um estilo de vida, uma relação entre história, lugares e pessoas, uma vivência individual e coletiva, que o pintor traduz em forma de arte.




Piazza d´Italia (monumento ao poeta), 1969 óleo sobre tela 80 x 60 cm

A cidade dequiriquiana assume formas e características diversas: a metafísica, a renascentista, a hermética, a moderna. A mais conhecida é a cidade metafísica, cuja concepção nasce em Florença, mas amadurece em Ferrara: são os anos da Escola Metafísica, das correspondências com Ardengo Soffici e dos encontros com Carlo Carrà.2 E está bem sintetizada nas Muse inquietanti: nessa obra, dois fragmentos diversos - de uma torre e de uma fábrica - ladeiam o Castelo Estense, que aparece em perspectiva aberrante sobre um palco de tábuas onde se assentam silenciosas esculturas-manequins.

Mas a cidade dequiriquiana é também a do enigma renascentista e do eterno mito grego: refiro-me à igreja de Santa Maria Novella, de Florença, transfigurada numa espécie de templo, que serve de cenário para a partida dos Argonautas.

Há ainda a cidade hermética, figurada, por exemplo, em Gare Montparnasse, elogiada pelo amigo Guillaume Apollinaire e por seu círculo de poetas e filósofos _Giuseppe Ungaretti, Filippo Tommaso Marinetti, André Breton -, e que serviu de inspiração ao movimento surrealista.

Finalmente a cidade moderna, de praças geométricas, abarrotadas de silêncio e de melancolia, sobrecarregadas de vazio e de expectativa febril, onde se transfiguram os primeiros exemplos de arquitetura moderna, como a Mole Antonelliana3, que inspirou as Torres do silêncio; mais tarde, uma parte considerável da arquitetura do século passado remeteu a essa imagem de cidade4.



Muse inquietanti, 1924, óleo sobre tela 65 x 50 cm


Mas a articulação do imaginário urbano de De Chirico não se exaure na representação de espaços externos, que deveriam celebrar manifestamente a consciência do homem novo, mas também ilumina cenas de interior, penetra nos meandros dos edifícios, se insinua em cômodos remotos, paisagens secretas, como metáforas da mente e do coração do homem moderno, quase aludindo à sua complexidade psicológica.

Com efeito, em De Chirico a arquitetura entra na pele de edifícios despojados e ocupa com fragmentos inquietantes seus aposentos nus, cujas janelas dão para a paisagem urbana, mostrando um cenário composto dos mesmos elementos do interior e plasmado na mesma substância arquitetônica e pictórica. Os interiores se enchem de objetos arquitetônicos, carregados de valores metafóricos, e os ambientes se tornam teatros da memória, segundo a teoria dos loci da mnemotécnica clássica e renascentista, exemplarmente exposta por Frances Yates5. Assim, vemos tapetes de água atravessados com esforço por um homem numa embarcação, ocupados por templos, constelados de utensílios do ofício de pintor, que se acumulam em massas esculturais.

Como veremos, em seus escritos teóricos De Chirico toca explicitamente no tema da memória, que impregna sua pesquisa artística, e a entrelaça com a interpretação filosófica da história, que é inerente a ele. Além disso, impele as escolhas iconográficas até evocar as características sociais dos indivíduos nos objetos que os representam: simulacros de si mesmos, eles se olham em um espelho de artefatos que evidenciam sua natureza e dão corpo a seus sonhos.

O artista elege como argumentos exemplares os arqueólogos6, laboriosos mineradores da história e da memória, de cujas vísceras obscuras eles extraem e trazem à luz os sinais de civilizações esquecidas, que subjazem como fundamento da nossa. São representados como corpos enrijecidos, estruturas compostas pela sobreposição e encaixe de elementos da arquitetura greco-romana (templos, capitéis, tambores de colonas caneladas, ruínas e fragmentos de paisagem arcádica), cobertos por um pano drapejado e como assentados em cátedras; têm o rosto dos manequins silentes, numa melancólica pose inclinada.

A transfiguração dos cenários urbanos permite ao pintor inserir-se continuamente na história, de modo instintivo e natural, sem hiatos ou fraturas: há, de fato, uma sincronia entre passado e presente, mas sua maneira de sentir a cidade lança raízes em um húmus existencial antigo, que remonta aos gregos, em cujo centro se ergue o homem de espírito e de poesia, isto é, o sujeito dotado simultaneamente de psyché e téchne.

"Já entre os gregos era grande o culto pela arquitetura e pela disposição dos lugares onde deviam reunir-se poetas, filósofos, oradores, guerreiros, políticos e, em geral, indivíduos cujas possibilidades intelectuais superavam a dos homens comuns7."

Talvez De Chirico tenha sido o primeiro a intuir que a essência das cidades, em seu significado mais profundo, não se reflete necessariamente nas formas estabelecidas, mas no ordenamento compartilhado da vida social, encontrando sua máxima expressão no crescimento de indivíduos cultural e artisticamente criativos, em equilíbrio entre ingenium et ars.

Nesse sentido, os fragmentos e os cenários urbanos, cada uma das obras de arquitetura, os espaços interiores e as relíquias arqueológicas que De Chirico usa também extraem sua razão de ser da dimensão urbana que os gerou e aludem a uma cidade apenas idealmente completa. A "vida silente"8 que emana de suas obras nos dá a sensação não só do sonho, mas também da desolação, da incongruência, do aspecto enigmático do lugar representado.

Entretanto a justaposição de figuras arquetípicas não é somente uma técnica de composição, mas também expressão de associações de ideias, que jorram livres, inspiradas por elementos descolados de seus contextos9, os quais se tornam, assim, fragmentos estranhos entre si e imersos no cenário urbano como em um vazio originário. E é ao vazio, à ausência, que a composição alude para além das linhas nítidas do desenho, consolidando a impressão de uma realidade ambígua e efêmera. É como se perdurasse em torno de cada fragmento de cidade originário, ambivalente signo instituidor do sacrum (sacro-execrando) gravado com o arado na terra, insuperável, salvo ali onde a relha foi erguida pelo torrão, que separa a cidade da natureza, o dentro do fora, a norma da anomalia.

Plutarco descreve assim a fundação de Roma nas "Vidas paralelas": "Rômulo fixou ao arado a relha de cobre, acoplando sob o jugo o touro e a vaca, e traçou um sulco profundo como base dos muros. Esse sulco constituiu o circuito que a muralha deveria percorrer, chamada depois pelos latinos de Pomério, ou seja, post murum".




II figliuol prodigo, 1975 óleo sobre tela 10 x 70 cm


Do pensamento dequiriquiano emerge, pois, não tanto a imagem de uma cidade ideal, copiada a partir de modelos renascentistas, feita de espaços medidos e de ordenadas relações de concinnitas entre as partes, mas uma dimensão ideal própria do homem moderno, que reconhece os lugares congeniais a ele e simbolicamente experimentáveis por meio do "senso arquitetônico"10.

Por isso os cenários recompostos por De Chirico - mais paisagem urbanizada que cidade formalmente acabada - parecem incongruentes, irracionais, fraturados, e apenas a tonalidade e a matéria pictórica lhes conferem uniformidade. De fato, os lugares representados não são propriamente lugares; mas, assim como os objetos podem ser próteses e extensões do corpo, do mesmo modo eles se tornam subsídio da memória.

O ENIGMA ou o instrumento filosófico da perquirição artística

O enigma é, para De Chirico, o instrumento filosófico da perquirição artística. No prefácio ao catálogo da mostra de Milão de 1922, ele cita na epígrafe "Et Quid Amabo nisi quod aenigma est?" (E o que devo amar senão o enigma?), e a mesma frase aparecia na base de vários autorretratos dos primeiros anos de sua produção, entre eles o de 1911, exposto na mesma mostra, onde o pintor se figura numa postura melancólica, muito semelhante ao eco düreriano com que Karl Bauer retratou Nietzsche.

O enigma é a razão primeira de sua pesquisa, aquele sentimento interrogativo acerca do real, que fala uma língua obscura (ainossomai) e que é indagado pelo pintor por meio da análise visual e do "ofício"11, como ele define sua severa disciplina artística e a orgulhosa habilidade na representação.

O enigma dequiriquiano, inspirado na mitologia grega, contém em si, além da relação com a história, o problema da representação presente na questão que a Esfinge submete a Édipo, ou seja, uma divindade monstruosa à inteligência humana. O enigma é resolvido pela habilidade, toda humana, de conferir forma figurativa à própria existência12. Mas o enigma é também jogo, jogo de inteligência; e é justamente o jogo que pode subverter o sentido lógico e a ordem aparente da realidade.

Autofiguração e senso lúdico e erudito conferem ao enigma dequiriquiano uma espécie de duplicidade filosófica, que é devedora do espírito nietzschiano, como o próprio pintor confirma quando escreve: "A supressão do senso lógico na arte não é uma invenção nossa, dos pintores. É justo reconhecer ao polonês (sic) Nietzsche o primado de tal descoberta, que, embora em poesia tenha sido aplicada pela primeira vez pelo francês Rimbaud, em pintura o primado dessa aplicação cabe a este que subscreve"13.

De resto, toda a produção do primeiro De Chirico - e sua própria relação com os gregos clássicos e com a Itália - é filtrada pela cultura alemã do final do século XIX e, particularmente, pelo pensamento de Nietzsche.

Nascido na Grécia, De Chirico escolhe estudar artes na academia de Munique, onde, por influência de Arnold Böcklin e de Max Klinger, entra em contato com a reinterpretação em chave simbolista da antiguidade grega e latina e, ainda muito jovem, se aproxima das obras do filósofo alemão. A partir daí, surge a inspiração de temas pictóricos como a luz da tarde de outono, o tema de Ariadne como tríplice emblema de ciência, melancolia e embriaguez14, a melancolia como sentimento da modernidade15, a repetitividade dos ciclos naturais e históricos, até a paixão por Turim, onde Nietzsche viveu e que descreveu exprimindo o aspecto lírico e encantatório16 de suas praças severas, das arcadas, dos pórticos e da luz clara.

O enigma de De Chirico não busca resposta, mas quer suscitar uma indagação ulterior, uma Stimmung, que ele mesmo introduz algum tempo depois, quando, no famoso autorretrato de 1920, insere a inscrição: "Et quid amabo nisi quod rerum metaphysica est?".

A Metafísica, antes de ser corrente artística17 compartilhada, entre outros, com o irmão Andrea e com Carlo Carrà18, é para De Chirico uma ordem da realidade que ele colhe, num instante de suspensão do visível, do aparente, em um olhar fugaz sobre a realidade objetiva das coisas em si mesmas. E se manifesta como revelação.

O legado filosófico direto vem de Arthur Schopenhauer19, que em seu famoso texto O mundo como vontade e representação escreve: "Portanto nenhuma verdade é mais certa, mais independente de todas as outras e menos necessitada de prova do que esta: que toda coisa presente à consciência, todo este mundo, é apenas objeto em relação ao sujeito, intuição do intuinte, numa palavra, representação"20.

E De Chirico se alimenta do pensamento de Schopenhauer e reelabora alguns de seus aspectos: a possibilidade de "esquecer a si mesmo", ou seja, a própria vontade; a capacidade, própria do gênio21, de colher o noumeno; a contiguidade entre genialidade e loucura22, posta em estreita relação com a memória; o sentimento do sublime que irrompe da grandiosidade de espetáculos naturais e arquitetônicos23; as Artes como antídoto à frustração inerente à consciência e como manifestação sensível do Universal, que o homem pode contemplar apenas temporariamente.

Em De Chirico, pois, o pensamento filosófico de Schopenhauer nutre uma prática criativa que vê nos cenários urbanos um objeto de perquirição temporal por meio do qual se pode espreitar a imutabilidade daquilo que existe na simplicidade das coisas.

Artista, de fato, é aquele que, em virtude de sua sensibilidade especial, sabe abrir ao intuito as portas da compreensão do real, aquele que transmuta os fragmentos fugidios do tempo em constantes e condensa as intuições em visão; numa palavra, o artista é o gênio.

Além disso, a loucura24 e o sentimento de debilidade que a doença provoca alteram a relação com a realidade que nos circunda, provocando como um curto-circuito entre presente e passado e desestabilizando a memória, que perde o sentido da distância temporal e permite a coexistência de lugares e de objetos arcaicos ao lado dos objetos da vida cotidiana.

Uma prática criativa fundada nessas referências filosóficas não pode exaurir-se numa obra de arte única ou em um breve ciclo, mas deve reinterpretar constantemente e tornar a meditar os sujeitos e os objetos dos quais irrompe a revelação originária, recompondo-os em um sistema25 colocado à disposição do homem comum.

Por isso mesmo, repropor hoje a iconografia dos cenários arquitetônicos e urbanos em sua versão final adquire um especial valor de conhecimento: composição no espaço, elementos herméticos, cromatismos e luminosidade de fato se alimentam da verificação do tempo e, como numa partitura onde a diacronia se faz coexistência, parecem encarnar os objetivos de De Chirico, que, como Schopenhauer26, acreditava que da contemplação da obra de arte resultasse para todos uma intuição metafísica e o alcance de uma revelação.

Em "Nós, metafísicos", De Chirico torna explícita sua ligação com os dois filósofos alemães:

"A arte foi libertada pelos filósofos e pelos poetas modernos. Schopenhauer e Nietzsche foram os primeiros a ensinar o profundo significado do sem-sentido da vida e como esse sem-sentido pudesse ser transmutado em arte, ou melhor, devesse constituir o íntimo esqueleto de uma arte realmente nova, livre e profunda. Os bons artífices novos são filósofos que superaram a filosofia. Retornaram para cá; pararam diante dos retângulos de suas telas e de suas paredes depois de terem superado a contemplação do infinito. O terrível vazio descoberto é a própria, insensata e tranquila, beleza da matéria. Alegremo-nos de que tal descoberta seja acima de tudo jubilosa. A arte nova é a arte alegre por excelência [...] Tem algo do laboratório astronômico, do escritório de gestor de finanças, da cabine de portuário. Toda inutilidade é suprimida; imperam, no entanto, certos objetos que a estupidez universal relega entre as inutilidades. Poucas coisas. Aqueles quadrinhos e ripas que bastam ao artífice hábil para construir a obra perfeita"27.

A partir dessas palavras é possível estabelecer que, para De Chirico, a relação com o pensamento filosófico se resolve numa visão de ambientes arquitetônicos emblemáticos e de objetos curiosos, mas carentes de uma atração específica; contudo, ambos exprimem o mistério da forma, que tanto mais se enfatiza e impregna de significado quanto mais os objetos se desincorporam de sua utilidade.

Com que expedientes De Chirico alcança seu objetivo poético e lírico? Com a ausência do homem, isto é, do próprio idealizador e construtor dos cenários e dos objetos representados, e com aquela atmosfera de suspensão temporal, expressa pela luz seca, a perspectiva múltipla28, o amálgama cromático, a matéria pictórica.

Além disso, a ausência de ação dos sujeitos faz com que qualquer artefato, seja ele arquitetônico ou objetual, se transmude em monumentum, em memória da ação, tornando-se símbolo de uma vida em potência que, à espera de ser acionada, se manifesta apenas nos artefatos nus.

A pintura dequiriquiana, não se concentrando mais na ação ou na presença humana, mas no cenário urbano e nos interiores povoados de objetos, supera a tradicional distância entre figura e desenho arquitetônico e determina uma diferença conceitual fundamental, que marca a fundo a cultura do século XX, fazendo de De Chirico uma das principais referências para a moderna arquitetura italiana29, e não só italiana.

Na realidade, De Chirico atribui à suspensão temporal a ideia de eternidade, concebida como eterno retorno, que é aliás o tema específico de todas as suas obras, nas quais os motivos, as ambientações, os fragmentos, as associações e até os títulos se repetem, da primeira à última.

Nisso reside sua concepção do homem moderno inserido na continuidade da história. De fato, diante do eterno enigma que se repropõe a cada ciclo, com sua própria capacidade de figuração o homem moderno dissolve seu sigilo e se liberta de sua tirânica opressão, assim como Édipo fez no início dos tempos.

Mas é a sensibilidade artística que, segundo De Chirico, leva até a consciência a inelutável relação entre vida e enigma, e é a arte metafísica que torna manifesta a inelutabilidade do enigma, como imanência e permanência.

A MODERNIDADE ouo objeto da perquirição artística

De Chirico pode, a todos os títulos, definir-se um perscrutador do homem moderno, tanto é que seus cenários urbanos marcaram seja o debate travado em sua época, seja a discussão atual; com efeito, a herança de seu olhar é reconhecível em muitas expressões da arte e da arquitetura do século passado, até as explosivas utopias urbanas dos anos 1970, provavelmente pela sensação de mal-estar que até hoje a contemplação de suas pinturas provoca.

Seu imaginário arquitetônico foi tratado com profundidade em relação a diversos filões que parecem inspirar-se nele, dos surrealistas30 aos arquitetos italianos ligados ao fascismo até os expoentes do pós-modernismo italiano31, mas a atualidade dele talvez ainda esteja a ser explorada à luz de sua interpretação pessoal e original das relações entre homem e espaço, das quais ele faz derivar a maturação da consciência do indivíduo moderno. Tal interpretação o levou, por um lado, a romper com Breton, que estava ligado à visão freudiana - segundo a qual a ação, e eventualmente até a ação coletiva, é motivada por características inconscientes e pessoais -, por outro, a manter-se distante do debate sobre a arquitetura e sobre a monumentalidade fascista.

De fato, para De Chirico, o indivíduo é identidade consciente e independente, que não submete nem subordina as próprias escolhas ao contexto pessoal, e menos ainda histórico, em que está inserido. E a própria vida de De Chirico, embora distante da arena política, se distingue por precisas preferências culturais, por inequívocas posições artísticas e escolhas de ofício, que evidenciam, por um lado, sua independência do debate estritamente político e, por outro, seu profundo envolvimento no contexto artístico da época. Sua atitude perante a vida pública reflete uma visão individualista, segundo a qual, quando se assume uma posição diante do mundo específico, age-se responsável e coerentemente como sujeitos políticos, e não dentro de uma ideologia predeterminada, mas como cidadãos do mundo.

É por meio dessa chave que devemos abordar seu modo de conceber o indivíduo como fulcro do próprio mundo, assim como na antiguidade grega o cidadão era o centro da polis.

E De Chirico foi um ativo protagonista de seu tempo; de fato, demonstrou uma vitalidade vigorosa e surpreendente, não só na produção artística, tão sutilmente cambiante nos motivos e na técnica, e no entanto tão coerente na inspiração, mas também na sua figura de crítico, de polemista e de escritor, como transparece em sua autobiografia quando relata viagens e encontros intelectuais e humanos, que para ele foram fonte inexaurível de reflexões críticas, levando-o a ser o precursor de temas e de intuições, de mudanças de perspectiva e de transformações no mundo da arte32, como confirma a imensa bibliografia dedicada a ele.

Com efeito, ele tecia um diálogo intenso com personalidades da cena intelectual e artística da época, ao lado do irmão Alberto Savinio33. Particularmente nas temporadas parisienses, ele estreitou uma relação de cumplicidade com Guillaume Apollinaire - como já acenamos mais acima - que foi determinante na orientação de suas temáticas pictóricas, tornou-se amigo de Giuseppe Ungaretti e de Ardengo Soffici, que o apresentaria nos anos de Ferrara a Carlo Carrà, e finalmente frequentou André Breton, de quem foi mestre.

Entretanto, é no contexto da Academia de Munique que De Chirico entra em contato com algumas das principais temáticas que depois terão impacto em sua interpretação do espaço, entre as quais a praça como fragmento de cidade e os cenários arquitetônicos alusivos de um mundo apenas intuído; seguramente ele foi influenciado por seus mestres ideais, Böcklin e Klinger, ligados a Goethe por sua paixão pelas viagens à Itália e pela mitologia clássica, e ficou impressionado com a arquitetura da cidade e com os últimos lampejos daquele historicismo, que algumas décadas antes produzira as arquiteturas neoclássicas de Leo Von Klenze34.

Por isso considero mais que fundada a hipótese de que De Chirico, por meio dessas referências, tenha remontado ao escritos de Jacob Burckhardt35, o maior historiador do Renascimento italiano, de Konrad Fiedler, teórico da arte, de Wilhelm Wundt, pai fundador da psicologia, e de Heinrich Wölfflin, também historiador da arte, que defendera na Munique de 1886 a tese de doutorado Prolegomena zu einer Psychologie der Architektur36.

É no estudo de Wölfflin que de fato podemos encontrar as referências para interpretar algumas das temáticas que De Chirico estabeleceu como fundamento de sua investigação pictórica, sobretudo a idéia - de matriz renascentista - de que a cidade e o espaço urbano poderiam representar o homem37.

Numa passagem do Prolegomena wölfflinianos, Wölfflin busca demonstrar que o espaço, as arquiteturas e os objetos, em virtude de sua forma e do caráter estilístico, aludem à psicologia dos indivíduos e, ao mesmo tempo, suscitam sentimentos em quem os contempla; assim ele escreve: "Nos mesmos sentimos o tormento de estados de espera incerta, quando não se pode encontrar a paz de um centro de gravidade. Gostaria de recordar aqui a água-forte de Dürer, a Melancolia I. Nela observamos uma mulher em atitude de sombria meditação, que fixa um bloco de pedra. O que isso significa? O bloco de pedra é irregular, irracional, não se deixa conceber por números e compasso. Mas não é só isso. Se observarmos a pedra, não parece que ela está para cair? Certamente. Quanto mais se observa, mais somos atraídos para essa atmosfera de falta de paz; um cubo com sua absoluta gravidade pode até resultar tedioso, mas está completo em si e resulta, pois, satisfatório para quem o observa; aqui, porém, nos deparamos com a penosa agitação de algo que não consegue assumir uma forma completa"38.


Termopili, 1971, Óleo sobre tela 55 x 65 cm



Le muse inquietanti 1968 escultura em bronze prateado - 35,5 x 16 x 16 cm


A afinidade de De Chirico com esse pensamento é espantosa, tanto mais quando se pensa que naqueles anos a teoria das artes figurativas estava se desenvolvendo como ciência autônoma e, em especial sob a influência de Fiedler, começava-se a interpretar os dois conceitos de Arte e de Belo como distintos, atribuindo-se à Estética o estudo da percepção e à Teoria da Arte a pesquisa sobre a criação de formas39.

Então, quando em 1912 Giorgio De Chirico relata sua revelação metafísica, ocorrida em Florença em 1910, parece repercutir as teorias psicológicas de Wundt40, às quais Wölfflin se referia, mais que a contemporânea psicanálise freudiana: "Durante uma tarde clara de outono, eu estava sentado num banco no meio da praça Santa Croce, em Florença. Certamente não era a primeira vez que eu via essa praça. Tinha acabado de sair de uma longa e dolorosa doença intestinal e me encontrava em um estado de sensibilidade quase mórbida. A natureza inteira, até os mármores dos edifícios e dos chafarizes, me parecia convalescente. No meio da praça se ergue uma estátua que representa Dante envolto em um longo manto, apertando sua obra contra o corpo e inclinando para a terra a cabeça pensativa, coroada de louros. A estátua é de mármore branco, mas o tempo lhe conferiu uma tonalidade cinzenta, muito agradável de se ver. O sol outonal, tépido e sem amor, iluminava a estátua e a fachada do templo. Então tive a estranha impressão de ver todas aquelas coisas pela primeira vez. E a composição do quadro surgiu ao meu espírito; e toda vez que vejo esse quadro revivo aquele momento. Momento que, no entanto, é um enigma para mim, posto que inexplicável. Por isso gosto de chamar de enigma a obra que derivou dele"41.

Pois bem, é no intervalo entre a arte que, expressando a identidade psicológica, embaralha a percepção da realidade e a arte que, despindo o inconsciente, pode subverter a própria realidade que se insere a vibrante polêmica com os surrealistas e se consuma a ruptura com Breton42.

De fato, para os surrealistas a arte recupera as emoções recalcadas recorrendo a um processo análogo ao do sonho, cuja memória, ao despertar, traz à luz os processos psíquicos inconscientes.

Breton escreve: "Impregnado de Freud como eu ainda estava naquela época, e familiarizado com seus métodos de investigação, que tive ocasião de praticar um pouco com alguns doentes durante a guerra, decidi obter por mim mesmo aquilo que se busca obter por eles, ou seja, um monólogo proferido o mais rapidamente possível, sobre o qual o espírito crítico do sujeito não possa exercer nenhum julgamento, e que não seja, pois, travado por nenhuma reticência, sendo o mais exatamente possível o pensamento falado"43.

Nessa perspectiva, para o Surrealismo o aspecto personalista assume uma função primária na interpretação do mundo, e se poderia afirmar que o vivido, às vezes marcado e como impregnado do trauma originário de um drama pessoal, representa para eles o motor da busca artística, que segue o ethos da comunicação e pode, assim, induzir à reivindicação e ao resgate do conformismo produzido pela sociedade burguesa44.

Breton se inspirou no ensaio de Freud, Gradiva45, delírio e sonhos na Gradiva de W. Jensen46, de 1906, em que a narrativa é analisada segundo a teoria da interpretação dos sonhos, assim como se faz com o paciente estendido no divã do analista, e o estabeleceu como base de suas teorias sobre a estética.

Contrariamente a Breton, De Chirico parece considerar que o aspecto psicológico, ligado à intuição artística, deva ser concebido em sentido universal, e que essa característica tornaria possível a comunicação e a partilha de intuições absolutas destiladas em visões que dizem respeito, por exemplo, à arquitetura. De fato ele escreve: "O sentimento da arquitetura é provavelmente um dos primeiros que os homens experimentaram. As habitações primitivas, escavadas nas montanhas ou agrupadas em meio ao pântano, seguramente suscitaram em nossos remotos ancestrais um sentimento confuso, feito de mil outros, do qual se desencadeou no curso dos séculos aquilo que já chamamos de sentimento da arquitetura"47.

Na realidade, com a distância histórica, essa atitude parece mais próxima a Freud, especialmente ao ensaio de reconstrução biográfica sobre Leonardo da Vinci48, do que o dissídio com os surrealistas faria supor; refiro-me ao brilhante ensaio de Ernst Gombrich sobre a estética de Freud e a psicologia da arte. Gombrich afirma que, de acordo com Freud, as ideias inconscientes podem ser comunicadas e constituir, assim, uma reflexão artística partilhável desde que adequadas ao pensamento formal, mediante a estrutura, a composição e o caráter estilístico; é o contrário do que foi habitualmente defendido a partir justo de Breton, segundo o qual uma estética deduzida de Freud pressupõe que a obra de arte seja sempre e de qualquer maneira determinada pelo inconsciente, fonte e origem de uma perturbação, o unheimlich49, que somente pode ser expressa pelo artista.

Segundo a linha de raciocínio exposta por Gombrich, parece no entanto legítima a obsessão50 de De Chirico quanto ao desenho e a qualidade pictórica, quando ele inclusive defendia que o excesso de subjetividade embrutece a expressão artística, e que o esforço do artista consiste, ao contrário, na capacidade de restituir expressão lírica aos aspectos anônimos e obscuros da vida cotidiana.

"Aquilo que importa", ele anota, "é sobretudo uma grande sensibilidade [...] entender o enigma das coisas em geral consideradas insignificantes."51

De fato, embora De Chirico tenha feito parte do Movimento Surrealista, como testemunha sua presença na fotografia de grupo feita em 1922, ele rapidamente se afastou com violenta polêmica, criticando asperamente os resultados que derivavam de seus pressupostos teóricos; em particular, ele objetava aos surrealistas que o aspecto subjetivo e pessoal não deveria ser o único elemento gerador da pesquisa artística, ao passo que deveriam ser considerados primordiais os aspectos compositivos e técnicos, aqueles "instrumentos de ofício" elaborados ao longo dos séculos, com os quais o artista eleva temáticas até menores a uma dimensão poética.

A atenção para a análise psicológica, herdada da academia de Munique, e a interpretação de si e do mundo por intermédio da representação tinham criado uma profunda sintonia com Apollinaire e ligado De Chirico à dimensão eclética da perquirição poética e filosófica da Paris do pré-guerra, círculo que levou Paul Valéry a escrever, em 1923, Eupalinos ou O arquiteto52, que na tradução italiana será comentado por Giuseppe Ungaretti. Nesse texto sob forma de diálogo entre Fedro e Sócrates se relatam as habilidades de Eupalinos, um arquiteto de Megara que, ao construir um pequeno templo dedicado a Hermes, havia impresso nele a imagem de sua amada transfigurada por meio de princípios matemáticos e marcas estilísticas.

Segundo De Chirico, a reflexão artística - que contém em si a modernidade do homem, entendido como sujeito capaz de interpretar o mundo com os sentidos e a inteligência - deve apoiar-se no fundamento do "pensar por imagens"53, como ele o define, o único sobre o qual poderia edificar-se um modo radicalmente novo de conceber o mundo.

De resto, foi naqueles anos que a historiografia e a história da arte se tornaram instrumentos para decifrar a natureza do homem por meio da iconografia e da iconologia; a título de exemplo, basta citar Aby Warburg, que em 1929 escreve sobre Mnemósine: "Introduzir conscientemente uma distância entre o eu e o mundo externo é aquilo que sem dúvida podemos designar como o ato fundador da civilização humana; se o espaço assim aberto se torna substrato de uma criação artística, então a consciência da distância pode dar lugar a uma duradoura função social, cuja adequação ou cujo fracasso como meio de orientação intelectual equivalem justamente ao destino da cultura humana"54.

É nesse clima cultural que amadurece a concepção personalíssima de De Chirico sobre o homem moderno e sobre a construção do mundo, concepção que aproxima de nós sua obra e seu pensamento, tornando-os atuais em sentido amplo e em episódios específicos de sua trajetória humana e artística. Por exemplo, é notória sua relação irreverente com o mercado das artes, que foi sem dúvida instigado pela polêmica com os surrealistas, mas que não é estranho às ideias formuladas por Georg Simmel, o primeiro a associar o dinheiro - e nesse caso o valor da obra de arte - à expressão racional extrema do intelectualismo metropolitano55.

Se indagar a natureza moderna do homem significa desvelar a ligação entre identidade do sujeito e interpretação do mundo, e se o desvelamento necessita de um palco de onde sobressair para tornar-se explícito, por De Chirico são evocados a imagem da cidade e os cenários urbanos, cujos fragmentos arquitetônicos e arqueológicos acolhem figuras interrogativas e inquietantes.

Podemos considerar este o primeiro momento de uma investigação artística que atravessa a obra de De Chirico para compreender outras que veem o homem como sujeito, e a natureza e a arquitetura da cidade como objetos de uma nova compreensão da realidade, e na obra artística o detonador de uma potencial transfiguração. Disso resulta que somente por meio da tomada de consciência de um ou mais sujeitos seria possível ativar-se aquela indagação capaz de perturbar a ordem normatizada que condiciona o cotidiano.

Ao final deste percurso interpretativo, vem de modo espontâneo interrogar-se sobre a herança deixada pelo pensamento teórico e pelo imaginário estranho de De Chirico. Colhem-se seus legados transversalmente naquele mundo da arte e da arquitetura que coloca no centro de sua reflexão a cidade, bem como nas escolas de pensamento que perseguem na interpretação perceptiva e psicológica, seja do indivíduo, seja de grupos, o germe criativo de uma nova sociabilidade. Para concluir, vale a pena citar aqui duas formas significativas de reelaboração da herança dequiriquiana, que se situam nos antípodas uma da outra.

De um lado, Aldo Rossi repropõe, tanto nos croquis e nas telas quanto nos projetos e nas obras edificadas, a lógica do fragmento urbano e, tornando a evocar a cidade como locus memoriae e sedimento de arquétipos, marca suas arquiteturas com um explícito estigma identitário, que é filtrado por uma erudita e encantada iconografia historicista.

Por outro lado, os Situacionistas assumem a ideia da cena urbana como o lugar por excelência da obra de arte cotidiana; não por acaso, em seus textos eles citam como modelo de referência ideal as praças metafísicas, que aludem a uma nova interpretação do espaço-tempo e a um vazio de expectativas a ser preenchido56 /57.

Ambas as interpretações do pensamento e da obra de De Chirico, apesar de tão diferentes nos resultados, nos levam a refletir sobre o sentido da contemporaneidade e sobre a função da arte, renovando as questões que são intrínsecas à experiência artística e teórica de De Chirico: podemos ainda considerar a modernidade como uma forma de classicismo?; a arte pode interpretar o mundo, pode prefigurar e gerar um outro, mais adequado às aspirações dos indivíduos?



*Tradução de Maurício Santana Dias

Bibliografia:
1 G. De Chirico, Estetica metafisica, em Valori plastici, Roma, a. I, n. 4-5, abril-maio de 1919; agora em Giorgio De Chirico, Scritti/1 (1911-1945). Romanzi e scritti critici e teorici, organizado por Andrea Cortellessa, Bompiani, Milão, 2008, p.292.
2 P. Fossati, La pittura ‘Metafisica’, Einaudi, Turim, 1988.
3 M. Ursino, L’effetto metafisico 1918-1968, Gangemi Editori, Roma, 2010.
4 V. Trione, Giorgio De Chirico, La città del Silenzio: architettura, memoria, profezia, Skira, Milão, 2008, p. 88-128.
5 F. Yates, L’arte della memoria, Einaudi, Turim, 1996.
6 Os arqueólogos serão, assim como as praças, um tema recorrente na investigação artística de De Chirico, a tal ponto de se tornar, nos últimos anos, um tema também da escultura. (N.A.)
7 G. De Chirico, Il senso Architettonico nella pittura antica, em Valori plastici, Roma, a. III, n. 5/6, maio-junho de 1920, agora em Scritti/1, op. cit., p. 303.
8 O termo “vida silente” foi atribuído por De Chirico às suas naturezas-mortas a partir de uma tradução poética da expressão alemã still leben e inglesa still life. (N.A.) G. De Chirico, Le nature morte, em L’Illustrazione Italiana, Milão, 24 de maio de 1942, agora em Scritti/1, op. cit., p. 476-480.
9 Cabe lembrar que, naqueles anos, o surgimento do conceito de descontextualização na arte como operação conceitual de subversão da realidade foi levada às suas últimas consequências por Marcel Duchamp, extrapolando objetos do uso comum de seu contexto natural.
10 Senso arquitetônico é uma expressão cunhada por De Chirico no texto Il senso architettonico nella pittura antica. Cf. nota 7.
11 De Chirico dedica grande atenção à pesquisa das técnicas pictóricas, definindo-as como “ofício”. Para comprovar seu especial interessa, veja-se G. De Chirico, Piccolo trattato di tecnica pittorica, Scheiwiller, Milão, 1928, agora em Scritti/1, op. cit., p. 1-43.
12 Na entrada de Tebas, Édipo encontrou a Esfinge assentada no monte Fício. A Esfinge era um monstro com cabeça de mulher, corpo de leão, cauda de serpente e asas de águia. Todo dia ela propunha a mesma adivinhação: “Quem é o animal que de manhã caminha sobre quatro patas, de tarde sobre duas e à noite sobre três?”. Nenhum tebano conseguia resolver o enigma, e a Esfinge todo dia devorava um. Quando Édipo pronunciou a resposta, “é o homem”, a Esfinge caiu no precipício e morreu. (N.A.)

13 G. De Chirico, Noi Metafisici, em Cronache di attualità, Roma, 15 de fevereiro de 1919, agora em Scritti/1, op. cit., p.273.
14 “os quadros pintados em 1913 veem sistematicamente a presença de Ariadne nas praças da Itália [...] Ariadne é o momento da ciência (quando ajuda Teseu a entrar no labirinto e derrotar o Minotauro), é o momento da melancolia (quando é abandonada por Teseu), é o momento da embriaguez (quando é conquistada por Dioniso)”. Cf. Maurizio Fagiolo dell’Arco, Classicismo pittorico, Costa e Nolan, 1991, Gênova, p.76.
15 O autorretrato de 1911, com o rosto apoiado na mão, remete à famosa litografia do retrato de Nietzsche feita por Karl Bauer, que por sua vez alude à gravura Melancolia I, de Albrecht Dürer.
16 Turim é citada por Nietzsche em Ecce Homo e nos Carteggi con gli amici del 1888. Cf. P. Waldberg, M. Sanouillet, R Label, Metafisica, Dada e Surrealismo, Fabbri, Milão, 1975, p. 31-32.
16 O que mais tarde será chamado pelos historiadores de “Escola metafísica” nasce em Ferrara, entre 1917-1919, em torno de figuras-chave que incluem, além do próprio De Chirico, Carlo Carrà, Filippo De Pisis, Alberto Savinio (Andrea De Chirico) e Giorgio Morandi. (N.A.)

17 É Carlo Carrà que, sem citar Giorgio De Chirico, escreverá o livro Pittura Metafisica, em 1919, o que levará a um rompimento entre o autor e o próprio De Chirico. Cf. P. Fossati, La ‘pittura metafisica’, op. cit., p.125.
19 A. Schopenhauer é citado várias vezes nos textos de De Chirico, que aqui se refere, a título exemplificativo quanto à incompreensão do termo por parte dos críticos, nos seguintes termos: “Hoje o crítico de arte quer passar por lírico, brilhante, complicado, é um mamífero que cresce e se desenvolve em todos os climas e sob qualquer latitude. Entre nós, podemos infelizmente listar numerosos exemplares em plena atividade. Ingênua e provincianamente, eles abocanharam o anzol de certa retórica modernista parisiense, e, então, dá-lhe com o “clima”, a “emoção”, a “inquietude”, o “mistério”, a “dramaticidade”, o “sonho” e especialmente com o “surrealismo” e a “metafísica”. Pobre metafísica! Canto consolatório do velho Schopenhauer!”. G, De Chirico, L’eterna questione’, publicado com o título Vox clamans in deserto, parte I, L’ambrosiano. Milão, 23 de fevereiro de 1938; agora em Scritti/1, op. cit., p.393.
20 A. Schopenhauer, Il mondo come volontà e rappresentazione, Newton and Compton, Roma, 2011, p.99.
21 “Apenas por meio da pura contemplação inteiramente fundida no objeto, como descrita acima, as ideias são percebidas, e a essência do GÊNIO consiste justamente na superior faculdade de tal contemplação; e, como esta exige um total esquecimento da própria pessoa e de suas relações, a GENIALIDADE não é senão a mais perfeita OBJETIVIDADE, isto é, orientação objetiva contraposta à subjetividade, que se volta para a própria pessoa, isto é, para a vontade”. A. Schopenhauer, Il mondo come volontà e rappresentazione, op. cit., p. 212.
22 “Se nós, segundo indicamos, observamos o louco entender exatamente cada momento presente e até muitos momentos do passado, mas sem perceber suas conexões e relações e, portanto, equivocar-se e delirar, é justamente esse seu ponto de contato com o indivíduo genial, pois também este último, descuidando do conhecimento entre as relações, que é atrelado ao princípio causal, para ver e buscar nas coisas somente suas ideias, para apreender sua autêntica essência, que se manifesta de modo intuitivo, e em relação à qual UMA só coisa representa o gênero inteiro e, por isso, como diz Goethe, um caso vale por mil; também o homem de gênio perde de vista, nesse ponto, o conhecimento da conexão entre as coisas: o único objeto de sua observação, ou seja, o presente colhido por ele de modo excessivamente vivo, aparece numa luz tão clara que, por assim dizer, os outros elos da cadeia, à qual ele pertence, são obscurecidos, e isso causa justamente fenômenos que têm uma semelhança há muito tempo reconhecida com os da loucura”. A. Schopenhauer, ibidem, p.220.
23 “Muitos objetos de nossa intuição suscitam a impressão do sublime pelo fato de que nós, em virtude de sua grandeza espacial e de sua grande antiguidade, ou seja, de sua duração temporal, diante deles nos sentimos reduzidos a nada, e no entanto nos deliciamos gozando de sua visão: desta espécie são as montanhas de grande altitude, as pirâmides egípcias, as ruínas colossais da remota antiguidade”. A. Schopenhauer, ibidem, p.233.

24 “Tomemos um exemplo: eu entro em um quarto, vejo um homem sentado numa cadeira, do teto pende uma gaiola com um canarinho dentro, percebo quadros na parede, livros numa estante; nada disso me surpreende ou me espanta, pois a corrente das recordações que atam uma coisa a outra me explica a lógica daquilo que vejo; mas suponhamos que, por um instante e por causas inexplicáveis e independentes de minha vontade, a continuidade dessa corrente se rompa: quem sabe como eu veria o homem sentado, a gaiola, os quadros, a biblioteca; e quem sabe, então, que espanto, que terror e talvez até que doçura e consolação eu experimentaria mirando aquela cena”. G. De Chirico, Sull’arte metafisica, com o subtítulo Pazzia e arte, em Valori Plastici, Roma, a. I, n. 4-5, abril-maio de 1919; agora em Scritti/1, op. cit., p. 289.
25 “Embora sua própria autobiografia distinga um primeiro período metafísico, o artista confere a cada fase do trabalho o atributo de metafísica. Depois da ‘catástrofe kantiana’, metafísica é, em De Chirico, compensação, escolha humanista substancial e filosófica. A arte recria a metafísica por meio da forma, o sistema concebido por De Chirico tende a refundar a experiência por meio da forma. A dialética instituída por Schopenhauer sobre o criticismo de Kant e contra o Materialismo fornece a base sistemática da Metafísica de De Chirico”. J. de Sanna, De Chirico: la Metafisica del Mediterraneo, Rizzoli, Milão, 1998, p.11.
26 “Por conseguinte, devemos supor que em todos os homens, à exceção daqueles totalmente incapazes de prazer estético, esteja presente aquela faculdade de reconhecer as ideias nas coisas e de despojar-se, desse modo, da própria individualidade. Em comparação a eles, o gênio só é superior pelo grau muito mais elevado e pela duração mais contínua daquele modo de conhecer, os quais lhe permitem manter nele a reflexão necessária para repetir numa obra livremente produzida aquilo que foi conhecido; e tal repetição é a obra de arte, por meio da qual ele comunica aos outros a ideia que apreendeu e que permanece, assim, imutável e idêntica; o resultado é que o prazer estético é idêntico, quer seja causado por uma obra de arte, quer seja provocado diretamente pela intuição da natureza e da vida. A obra de arte é simplesmente um meio de facilitar aquele conhecimento em que consiste o prazer”. A. Schopenhauer, Il mondo come volontà e rappresentazione, op. cit., p. 221.
27 G. De Chirico, Noi metafisici, op. cit., p.271-272, cf. nota 13.
28 J. di Sanna, Giorgio De Chirico. Analisi della forma. Teoria, em De Chirico, la metafisica del Mediterraneo, Rizzoli, Milão, 1998, p.11-33.
29 V, Trione, Giorgio De Chirico. Le città del silenzio: architettura, memoria, profezia, op. cit., p.88-128.
30 A.H. Merijan, Soppravvivenze delle architetture di Giorgio De Chirico, em Arti e Architettura 1900/1968, catálogo organizado por Germano Celant, Skira, Milão, 2004, p.31-38.
31 V. Trione, El siglo de Giorgio De Chirico, Metafisica y arquitectura, Skira, Milão, 2007.
32 Deve-se sublinhar sobretudo sua relação polêmica com a arte moderna (N.A.). Cf. Giorgio De Chirico, Considerazioni sulla pittura moderna, em “Stile”, janeiro de 1942; agora em Scritti/1, op. cit., p.433-455.
33Alberto Savinio é o pseudônimo adotado em Paris pelo irmão Andrea De Chirico.
34 Leo von Klenze (1784-1864) é o arquiteto alemão que foi encarregado por Ludovico I, rei da Baviera, de redesenhar Munique, cidade que ele queria transformar na Atenas sobre o Isar. Foi nesse contexto que ele projetou e mandou construir uma cópia fiel dos Propileus, a Gliptoteca, a Alte Pinakothek, a Königsplatz e a Ruhmeshalle.
35 Böcklin e Burckhardt se conheceram por volta de 1848, em Basileia, e o encontro foi determinante para Böcklin, já que, por causa dele, resolveu partir em sua primeira viagem à Itália para beber na fonte do classicismo e da renascença, evento determinante de sua poética. A amizade entre os dois durou até 1869, quando houve um rompimento por causa de numerosos dissabores e desacordos.
36 H. Wölfflin, Prolegomena zu einer Psychologie der Architektur, traduzido em italiano com o título de Psicologia dell’Architettura, organizado por Ludovica Scarpa, Davide Fornari et al. Srl, Milão, 2010.
37H. Wölfflin, idem, p.19.
38H. Wölfflin, idem, p.67.
39 H. Wölfflin, Idem, p.51-52.
40 G.N. Fasola, prefácio a H. Wölfflin, Concetti fondamentali della Storia dell’Arte, Longanesi, Milão, 1984, p.13-14.
41 “A cidade originária é o assentamento dos chefes políticos e militares da população que ocupa o novo território e que, desse modo, criou o estado. Isso se revela sobretudo no estado que, mais que qualquer outro, conservou os traços da antiga constituição: Esparta, onde a cidade aparece quase como uma transformação da ‘casa dos homens’, da organização tribal totêmica em uma cidade masculina, que se adapta ao poder político. Mas também em Atenas e nos estados gregos a cidade é apenas a sede do poder político, ao passo que o estado de estende a todo o território [...] A isso se associa a formação das profissões artísticas, artesanais e comerciais, que se separam da agricultura e, por fim, da burocracia política.” W. Wundt, Scritti, organização de C. Tugnoli, Unione Tipografico-Editrice Torinese, Turim, 2006, p. 728.
42 G. De Chirico, Méditation d’un peintre, 1912, Manuscritos Paulhan, agora em Scritti/1, op. cit, p.650.
43 Em 1925, os surrealistas, que tinham apontado De Chirico como seu mestre, o decretam morto em 1918 e empreendem um boicote de sua nova produção pictórica [A FRASE, PARA MIM, NÃO FAZ SENTIDO. DEVE ESTAR FALTANDO ALGUMA COISA NO TEXTO ORIGINAL]. Em resposta à mostra de sua recente produção, apresentada por Rosenberg (6-30 de maio), eles expõem algumas de suas obras do primeiro período, que estavam em sua posse, durante a mostra Pintura surrealista, na galeria Pierre (14-25 de novembro), e algumas de suas composições poéticas de 1911-13 são publicadas no n. 5 da revista Revolution Surrealiste. (N.A.)

44 A. Breton, Il Manifesto del Surrealismo, 1924, em A. Breton, Manifesti del Surrealismo, Einaudi, Turim, 2003, p.28.
45Inicialmente anarquista, André Breton aderiu ao partido comunista até 1932, quando se opôs à ideia de que a arte deveria coincidir com a propaganda política, entrando assim nas fileiras da facção trotskista. (N.A.)
46 Na Gradiva de W. Jensen, conta-se a história de um jovem arqueólogo alemão, Norbert Hanold, que numa viagem a Roma se apaixona por um baixo-relevo que representa uma jovem mulher a caminhar, inclinando o pé em uma graciosa e especial atitude. Em seguida, ele tem um sonho angustiante em que a mulher se encontra em Pompeia durante a erupção do Vesúvio, e ái morre. De volta a seu país, o jovem começa a fantasiar sobre a imagem, amadurecendo uma verdadeira obsessão pela jovem pompeiana. Quando decidi visitar Pompeia para sonhar de olhos abertos sobre seu amor impossível, ele a encontra nas vestes de um fantasma e passa a acreditar que está louco. Mais tarde, descobrirá que a mulher encontrada em Pompeia não é senão Zoe, sua vizinha e amiga de infância. (N.A.)
47 S. Freud, Gradiva, delirio e sogni nella Gradiva di W. Jensen, em Saggi sull’arte, la letteratura e il linguaggio, Boringhieri, Turim, 1977, v. 2.
48 G. De Chirico, Écrit sur l’architecture pour l’Esprit Nouveau, 1921, assinado com o pseudônimo de Giovanni Loreto, em Metafisica. Quaderni della Fondazione Giorgio e Isa De Chirico, n. 5/6, Le Lettere, Florença, 2006, p.481; agora em Scritti/1, op. cit., texto original em língua francesa, p.777.
49 S. Freud, Un ricordo d’infanzia di Leonardo da Vinci, Skira, Milão, 2010.
50 E.H. Gombrich, Freud e la psicologia dell’arte. Stile, forma, struttura alla luce della psicoanalise, Einaudi, Turim, 2001, p.46. Citado no texto: Transformation, 1951.
51 O termo Unheimlich foi utilizado pela primeira vez em psicologia por Ernst Jentch, em 1906, para decifrar a indefinição daquelas figuras que, mesmo sendo animadas, parecem como mortas. Em 1919, no ensaio Das Unheimliche, traduzido em italiano como Il perturbante, o conceito foi retomado por S. Freud para definir em âmbito estético aquele aspecto do medo que diz respeito ao que é familiar e, ao mesmo tempo, à estranheza de coisas, lugares e pessoas, determinando uma desagradável sensação de angústia e estranhamento. (N.A.)
52 G. De Chirico, Il ritorno al mestiere, em “Valori Plastici” I, 11-12, novembro-dezembro de 1919; agora em Scritti/1, op. cit., p.277-285.
53 G. De Chirico, Manoscritti Eluard, agora em Scritti/1, op. cit, p.612.
54 P. Valéry, Eupalino o dell’Architettura, tradução de R. Contu, com um comentário de G. Ungaretti e uma nota de Paul Valéry, Carabba, Lanciano, 1932. A primeira edição francesa é de 1923.
55 G. De Chirico, Discorso sul meccanismo del pensiero, em Documento, maio de 1943; agora em Scritti/1, op. cit., p.534-539.
56 Aby Warburg, Mnemosyne, l’atlante della memoria, Artemide edizioni, Roma, 1998, p.21.

57 G. Simmel, Il denaro nella cultura moderna, (organizado por Squicciarino), Armando, Roma, 2005. Cf. com G. De Chirico, Considerazioni sulla pittura moderna, em La commedia dell’Arte Moderna, Andrea Cortellessa (org.), Giorgio De Chirico. Scritti/1, op. cit., p.433-455.